Os direitos da Criança e do Adolescente são fruto de uma construção
social que tem como marco inicial a Declaração Universal dos Direitos do
Homem aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1948, que
pretendeu o resgate dos valores de igualdade e liberdade, esquecidos
durante a II Guerra Mundial. A partir de então, surgiram diversos
tratados internacionais e normativas constitucionais e
infraconstitucionais dos Estados membros da Organização das Nações
Unidas – ONU, a exemplo da Declaração de Genebra de 1924 e Declaração
Universal dos Direitos da Criança de 1959, que embasaram a formulação da
chamada Doutrina da Proteção Integral das Nações Unidades para a
Infância. A partir dessa doutrina as crianças passaram a ser vistas como
sujeitas de direitos próprios e proteção especial. Este entendimento se
estruturou ao longo dos anos e foi consolidado na Convenção
Internacional sobre Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral
das Nações Unidas em 20 de novembro de 1989 (RANGEL; VAGO CRISTO, 2004).
Segundo entendimento de Bezerra (2008), nosso país passou por três
fases no decorrer da sua história, no que diz respeito à proteção da
criança e do adolescente. A primeira delas foi marcada pela doutrina
penal do menor, a segunda pelo Código de Menores de 1979 e a última,
pela doutrina da proteção integral. Na doutrina penal do menor, o foco
era única e exclusivamente a prevenção da delinquência juvenil. Reflexo
disso são os Códigos Penais Brasileiros de 1830 e 1890, bem como o
Código de Menores de 1927:
Na esfera penal, o Código Criminal do Império do Brasil, sancionado no dia 16 de dezembro de 1830, instituía a inimputabilidade relativa dos menores de 14 anos, eis que adotando a teoria da ação com discernimento, estipulava também a pena de recolhimento a casas de correção aos que, compreendidos nessa faixa etária, cometessem crimes conscientes de sua conduta ilícita. [...] Semelhantemente, o Código Penal dos Estados Unidos do Brasil, promulgado pelo Decreto n.º 847, de 11 de outubro de 1890, portanto, já no período republicano, não reconhecia como criminosos os menores de 8 anos e os maiores de 9 e menores de 14 anos que cometessem crimes sem discernimento. [...] O Código de Menores de 1927, em seu art. 1º, previa uma série de medidas de assistência e proteção ao menor de 18 anos de idade abandonado ou delinquente (ROSA, 2010).
Como percebemos a preocupação do legislador era voltada apenas aos
menores que potencialmente poderiam causar algum prejuízo a sociedade
através da prática de delitos. Desta forma, os demais direitos
essenciais de proteção infanto-juvenil e dos quais são titulares todos
os menores, acabaram por serem esquecidos. Para Custódio (2006), na fase
seguinte, surge o Código de Menores de 1979, fundamentado na doutrina
da situação irregular, que previa a assistência para os menores que
estivessem fora do padrão ideal de comportamento, formatada sob a égide
da Política Nacional do Bem-Estar do Menor adotada em 1964. Com o
advento deste Código, evidenciou-se o fortalecimento das desigualdades e
da discriminação contra os menores pobres em situação irregular,
promovendo ainda, a cultura do trabalho que legitimava toda a sorte de
exploração contra crianças e adolescentes.
Esta doutrina apresentava graves distorções. Camuflada de sistema de
proteção, servia apenas para punir condutas praticadas por menores, como
assevera Liberati (2008, p. 13):
O Código revogado não passava de um Código Penal do “Menor”, disfarçado em sistema tutelar; suas medidas não passavam de verdadeiras sanções, ou seja, penas disfarçadas de medidas de proteção. Não relacionava nenhum direito, a não ser aquele sobre a assistência religiosa; não trazia medida de apoio à família; tratava da situação irregular da criança e do jovem, que, na realidade, eram seres privados de seus direitos.
Em resumo, o Código de Menores em nada contribuiu para a proteção da
criança e do adolescente.Na década seguinte, com o surgimento da
Constituição Federal de 1988 e do Estatuto da Criança e do Adolescente
em 1990, inicia-se o terceiro momento de proteção à criança e ao
adolescente, desta vez, fundado na doutrina da proteção integral, de
caráter efetivamente protecionista. Os menores passaram a ser vistos
como sujeitos de direitos, merecedores de proteção integral do Estado,
da sociedade e da família, por sua condição peculiar de pessoas em
desenvolvimento. Desta feita, toda a proteção lhes deve ser dada de
forma exclusiva e diferenciada.
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