sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Gabarito comentado à 2a fase civil do XI Exame OAB - Reais e Contratos



Enunciado
Jorge, professor de ensino fundamental, depois de longos 20 anos de magistério, poupou quantia suficiente para comprar um pequeno imóvel à vista. Para tanto, procurou Max com objetivo de adquirir o apartamento que ele colocara à venda na cidade de Teresópolis/RJ. Depois de visitar o imóvel, tendo ficado satisfeito com o que lhe foi apresentado, soube que este se encontrava ocupado por Miranda, que reside no imóvel na qualidade de locatária há dois anos. Mediante notificação extrajudicial, certificada a entrega a Miranda. Jorge firmou contrato de compra e venda por meio de documento devidamente registrado no Registro de Imóveis, tendo adquirido sua propriedade e notificou a locatária a respeito da sua saída. Contudo, ao tentar ingressar no imóvel, para sua surpresa, Miranda ali permanecia instalada. Questionada, respondeu que não havia recebido qualquer notificação de Max, que seu contrato foi concretizado com Max e que, em virtude disso, somente devia satisfação a ele, dizendo, por fim, que dali só sairia a seu pedido. Indignado, Jorge conta o ocorrido a Max, que diz lamentar a situação, acrescentando que Miranda sempre foi uma locatária de trato difícil. Disse, por fim, que como Jorge é o atual proprietário cabe a ele lidar com o problema, não tendo mais qualquer responsabilidade sobre essa relação. Com isso, Jorge procura o advogado, que o orienta a denunciar o contrato de locação, o que é feito ainda na mesma semana. Diante da situação apresentada, na qualidade de advogado constituído por Jorge, proponha a medida judicial adequada para a proteção dos interesses de seu cliente para que adquira a posse do apartamento comprado, abordando todos os aspectos de direito material e processual pertinentes.



Gabarito comentado

A peça cabível consiste em uma AÇÃO DE DESPEJO COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
Deverá ser proposta no foro da situação do imóvel (Art. 58, II, da Lei n. 8.245/91). Jorge deve figurar no pólo ativo e Miranda deve figurar no pólo passivo, ambos qualificados, atendendo ao disposto no Art. 282, do CPC. Ao explicitar os fatos, deve o examinando destacar a existência de relação jurídica material entre as partes decorrente da sub-rogação de Jorge nos direitos de propriedade, bem como no preceito legal disposto no art. 8º da Lei n. 8.245/91, que autoriza a alienação de imóvel durante o prazo da locação, concedendo o prazo de 90 dias para a desocupação do imóvel pelo locatário, após a denunciação do contrato. Deverá formular pedido de antecipação de tutela alegando presentes a verossimilhança e o periculum in mora, na forma do Art. 273, do CPC, já que não se trata das hipóteses do Art. 59, §1º, da Lei n. 8.245/91. O pedido de antecipação de tutela (Art. 273 do CPC) é norma geral, aplicável a qualquer processo de conhecimento, e como tal não pode ser afastada da ação de despejo, que se submete ao rito ordinário. Ao final, deverá formular pedido de concessão da antecipação de tutela, liminarmente, para o despejo da locatária, seguido do pedido de confirmação dos seus efeitos com a imissão definitiva do autor na posse do imóvel, além de custas e honorários de advogado.

 Fonte: http://img-oab.fgv.br/336/20131006095316-Padrao_Civil.pdf



Comentários à 2a fase civil do XI Exame OAB

 PEÇA

A questão envolve uma locação, em que o imóvel locado foi alienado – e não havia registro do contrato na matrícula do imóvel. O novo proprietário notifica o locatário para que desocupe, mas isso não ocorre. Diante disso, o que fazer?
O caso é relativamente simples para quem está acostumado com locação. Nessa situação, há a sub-rogação da locação, e o novo proprietário passa a ser o locador. Sendo assim, cabível a AÇÃO DE DESPEJO, nos termos do art. 5º da 8.245/91, que aponta que a “ação do locador para reaver o imóvel é a de DESPEJO”.
Pelo que ouvi de alunos, além de despejo foram elaboradas as seguintes peças:
- imissão de posse
- ação de obrigação de fazer
- execução
- reintegração de posse
Dessas peças, não me parece viável a execução (não seria caso de executar o contrato de locação e, quanto à compra e venda, a locatária não é parte) ou a reintegração de posse (o novo proprietário nunca teve posse – e o enunciado nada afirma quanto à existência de transferência de posse na compra e venda, para se apontar uma situação de sucessão na posse).
Mas – ainda que não seja a típica medida a ser utilizada – não vejo como “erradas” a imissão de posse (obtenção da posse a partir da propriedade) ou a obrigação de fazer (entrega da posse sob pena de multa-diária).
Ora, no sistema brasileiro, se é possível mais de um meio processual para se atingir o bem da vida, não é obrigatório que um meio seja utilizado. Nesse sentido, o seguinte precedente do STJ, bem recente:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO POSSESSÓRIA. CONDÔMINO. INTERVENÇÃO VIA EMBARGOS DE TERCEIRO. PROCESSO EXTINTO, DIANTE DA POSSIBILIDADE DE INGRESSO COMO ASSISTENTE LITISCONSORCIAL. DECISÃO A QUE SE ANULA. PROSSEGUIMENTO DA MEDIDA ESCOLHIDA PELO CONDÔMINO. RECURSO PROVIDO.
1. Se o sistema processual permite mais de um meio para obtenção da tutela jurisdicional, compete à parte eleger o instrumento que lhe parecer mais adequado. (…) 4. Recurso especial provido, para reconhecer a legitimidade e interesse de agir do recorrente para opor embargos de terceiro.
(REsp 834487/MT, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 13/11/2012, DJe 02/04/2013)

Apesar disso, considerando a redação do art. 5° da Lei de Locação, tenho dúvidas se a OAB irá aceitar quem não fez despejo. A tendência é que a OAB ZERE qualquer peça que não seja despejo, infelizmente. O que é uma pena, pois isso não seria a verdadeira avaliação do bacharel que quer iniciar sua carreira como advogado. O ideal seria a correção da peça, ainda que com um desconto por não se ter utilizado o despejo. Vejamos o que a OAB fará – comunicarei neste espaço o que souber, e peço que me informem o que ocorreu, para eu expor aos demais candidatos.
Agora, caso sua imissão não seja corrigida, SEM DÚVIDAS eu sugiro que se recorra.
Mas, prosseguindo no gabarito apresentado, há um ponto que também é objeto de debate. A solução proposta pela OAB fala em ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. Contudo, não me parece que o enunciado tenha trazido os requisitos necessários para tanto – especialmente o perigo da demora.
A verossimilhança da alegação está presente (pode ser presumida, a partir da previsão da Lei de Locação).
Mas a situação de urgência não pode ser “inventada” pelo aluno. E não há, no enunciado, qualquer indicativo de QUAL SERIA a situação de urgência a justificar a antecipação de tutela. E chama a atenção o fato de o próprio gabarito NÃO indicar QUAL É  o perigo da demora (o imóvel é para uso próprio de Jorge? é para obtenção de renda / complemento de aposentadoria? Não sabemos, o enunciado não diz – além disso, o próprio problema afirma que ele NÃO passa por dificuldades financeiras, pois “poupou” e comprou o imóvel).
Sendo assim, não me parece viável que a OAB tire pontos de quem não elaborou pedido de antecipação de tutela. Mas, uma vez mais, vejamos como será feita a correção.
Quanto à competência / legitimidade / causa de pedir, aí não há qualquer reparo ao enunciado. O valor da causa, não mencionado no padrão de respostas, seria 12 vezes o valor da locação (art. 58, III da L. 8.245/91).
Em síntese. Uma boa petição inicial e um razoável gabarito – com as RESSALVAS da (i) antecipação de tutela e (ii) admissão de outra peça que não o despejo.

QUESTÕES
Como mencionado, as questões surpreenderam por não trazer QUALQUER necessidade de conhecimento de jurisprudência ou súmula para as respostas. Em geral, as respostas estavam na lei – e, do que conversei com candidatos, a maioria foi bem.
1.a) Questão envolvendo ALIMENTOS GRAVÍDICOS, cujo prazo de resposta está na lei.
1.b) A legitimidade ativa, no caso, é da MÃE, conforme expressamente previsto no art. 1° da L. 11804/08.
Não é viável, nos termos da lei, se falar da legitimidade ativa do feto (independentemente da discussão doutrinária quanto a isso), inclusive pela redação do art. 6º, p.u. (conversão, após o nascimento, dos gravídicos em pensão em favor do menor).
2) A questão envolve CORRETAGEM, com as respostas aos tópicos previstas nos arts. 725 e 726 do CC.
3.a e b) Aplica-se o CDC na relação entre médico e paciente – isso porque há expressa menção do CDC aos profissionais liberais (art. 14, § 4º). Mas esse artigo mesmo destaca que, no caso, a responsabilidade depende de CULPA (assim, é subjetiva)
3.c) A inversão do ônus da prova decorre da presença dos requisitos do art. 6°, VIII do CDC – e não se confundo com responsabilidade objetiva ou subjetiva.
Agora, a menção à “teoria da carga dinâmica das provas” é, no caso, absolutamente desnecessária e só se presta a dificultar a vida do candidato (e trazer alguma “novidade” teórica para a prova). Essa teoria, defendida por alguns autores brasileiros e presente no projeto de NCPC, propõe, em síntese, que o ônus da prova é daquele que tem “melhores condições” de produzir a prova. Agora, qual a relevância disso para o caso? Nenhuma…
4.a) A questão envolve o divórcio extrajudicial, denominado na questão de “divórcio feito administrativamente”. Seus requisitos estão claramente previstos em lei (CPC, art. 1124-A).
4.b) Em relação à partilha de bens e dúvida quanto à aquisição de um bem, também a lei prevê expressamente a respeito de sua presunção (CC, art. 1662).

Portanto, em síntese tivemos uma prova boa e um gabarito razoável – exame melhor que o anterior, sem dúvidas.
Só esperemos que haja bom senso da OAB em relação aos pontos negativos do gabarito aqui apontados, para que possamos dizer que houve uma boa correção.
E, claro, espero que tenham ido bem. Se necessário, estamos à disposição para auxiliar na sua preparação no IEDI.
Cordialmente,
Dellore

 http://atualidadesdodireito.com.br/dellore/2013/10/09/2a-fase-civil-xi-oab/

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