sábado, 22 de dezembro de 2018

Saiba mais sobre os alimentos compensatórios


Por Maria Berenice Dias (Manual de direito das famílias, RT, 2013, 9ª ed., p. 572/576)
“28.19 Compensatórios
O tema é novo, não previsto de modo expresso na lei, mas, por insistência da doutrina, a justiça começou a reconhecer o direito a alimentos compensatórios. Para evitar confusões, talvez o melhor fosse falar em verba ressarcitória ou alimentos indenizatórios. De qualquer forma, não se confundem com os alimentos decorrentes das relações familiares (CC 1.694). Sua origem está no dever de mútua assistência (CC 1.566 III) e na condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família que os cônjuges adquirem com o casamento (CC 1.565). Este vínculo de solidariedade existe não só entre os cônjuges, mas também entre os companheiros (CC 265). Produzindo o fim da vida em comum desequilíbrio econômico entre o casal, em comparação com o padrão de vida de que desfrutava a família, cabível a fixação de alimentos compensatórios. O cônjuge ou companheiro mais afortunado deve garantir ao ex-consorte reequilibrar-se economicamente.
Faz jus a tal verba quem não perceber bens, quer por tal ser acordado entre as partes, quer em face do regime de bens adotado no casamento,que não permite comunicação dos aquestos. O pagamento pode ser feito em único pagamento ou de forma periódica. Nem assim podem ser considerados alimentos.
Os alimentos compensatórios não se confundem com os alimentos provisórios da Lei de Alimentos (LA 4.º parágrafo único), quando o juiz determina que seja entregue ao credor renda líquida dos bens comuns, administrados pelo devedor. A condição de que estejam as partes casadas pelo regime da comunhão universal de bens não persiste. Não há justificativa para deixar o juiz de determinar a entrega dos rendimentos com referência aos bens que, independentemente do regime de bens, pertencem ao casal. Assim, permanecendo na administração exclusiva de um os bens que produzem rendimentos, o outro faz jus à metade dos seus rendimentos a título de meação dos frutos do patrimônio comum, até a ultimação da partilha. Tal estratégia acaba, ao menos, servindo de instrumento de pressão para a divisão do patrimônio que, de modo geral, permanece nas mãos do varão, que o administra sozinho, ficando, na maior parte das vezes, com a totalidade dos rendimentos. 
Ainda que ambos disponham de nítido caráter reparatório e indenizatório, tal fato, por si só, não autoriza confundi-los. Apesar da distinção, a jurisprudência muito frequentemente se equivoca. Nomina de compensatórios os alimentos chamados provisórios (LA 4° parágrafo único) e que nada mais são do que a divisão dos frutos e rendimentos dos bens do casal, a título de ressarcimento pela não imissão imediata dos bens da meação a que faz jus.
 A distinção se faz necessária principalmente em sede de execução. A tendência é reconhecer que os alimentos compensatórios não autorizam execução pelo rito da prisão civil. A posição não é pacífica no âmbito do STJ, prevalecendo o entendimento de que o encargo de dividir os frutos não justifica a ameaça de aprisionamento. Muito mais razoáveis os argumentos do voto vencido da Min. Nancy Andrighi: Desprover essa verba do caráter alimentar que lhe é inerente teria o condão de conferir insustentável benefício ao cônjuge que se encontra na posse e administração dos bens comuns e que possa estar, de alguma forma, protelando a partilha deste patrimônio. […] Não é viável, portanto, esvaziar a possibilidade de execução alimentar mediante prisão civil de sua forte carga de constrangimento pessoal e reprovabilidade social, para deixar ao desalento o inarredável preceito ético de solidariedade familiar.
Os alimentos compensatórios são uma indenização pela perda da chanceexperimentada por um dos cônjuges durante o casamento. Assim, cabe ser ressarcido o desequilíbrio econômico ocasionado pela ruptura da vida, atentando-se ao princípio da equidade que serve de base ao dever de solidariedade. Como não dispõe de conteúdo alimentar, sua fixação não se submete às vicissitudes do trinômio proporcionalidade-possibilidade-necessidade. Dessa forma, mesmo que o beneficiário venha a obter meios de prover à sua própria subsistência, tal não dispensa o devedor de continuar alcançando-lhe o valor estipulado. A possibilidade revisional só cabe quando alteradas as condições econômicas do alimentante, em face da teoria da imprevisão, cuja cláusula rebus sic stantibus sempre está presente em se tratando de obrigações que se prolongam no tempo.
Outro ponto que não encontra uma resposta única em sede jurisprudencial diz com a compensação dos valores recebidos quando da efetivação da partilha. A tendência é admitir a compensação, quando se trata dos frutos dos bens comuns.
A obrigação alimentar persiste enquanto houver necessidade do credor e possibilidade do devedor. No entanto, ao menos com referência aos alimentos devidos a ex-cônjuge ou ex-companheiro, passou a jurisprudência a fixar, de forma absolutamente aleatória, alimentos por prazo determinado. A justificativa é que, tendo o alimentando potencialidade para ingressar no mercado de trabalho, não precisa mais do que um tempo para começar a prover ao próprio sustento. Dita sustentação não dispõe de respaldo legal. O parâmetro para a fixação dos alimentos é a necessidade, e não há como prever, a não ser por mero exercício de futurologia, que alguém a partir de determinada data, vai conseguir se manter.
Não se pode olvidar a dificuldade de acesso ao competitivo mercado de trabalho, principalmente a quem permaneceu dele afastado por alguns anos. Essa ainda é a realidade: as mulheres, com o casamento ou ao estabelecerem união estável, geralmente por exigência do varão, dedicam-se exclusivamente às tarefas domésticas e à criação dos filhos. Não há como fixar um prazo para que consigam sobreviver por conta própria. Às vezes, a fixação do termo final é condicionada à conquista de trabalho.
Ainda assim, para o devedor livrar-se do encargo, precisa buscar a via exoneratória, não havendo como deixar a seu bel-prazer estabelecer o fim da obrigação. O STJ criou perigoso antecedente ao extinguir o encargo alimentar pelo só fato de perdurar por significativo lapso de tempo, sem fazer qualquer questionamento sobre a persistência da necessidade do credor.
 Ainda que estabelecido a favor do ex-cônjuge encargo alimentar por prazo determinado, para inserir-se no mercado de trabalho, caso tal não ocorra, possível é prorrogar a obrigação por prazo indeterminado, principalmente se, em face da idade, ele não consegue meios para prover sua subsistência”.

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