domingo, 9 de outubro de 2011

Lesão

Lesão – Segundo Caio Mário (2004, 349), “a lesão qualificada ocorre quando o agente, premido pela necessidade, induzido pela inexperiência ou conduzido pela leviandade, realiza um negócio jurídico que proporciona à outra parte um lucro patrimonial desarrazoado ou exorbitante da normalidade”. Ex. Em época de seca, pagar-se preço exorbitante pelo fornecimento de água.

De acordo com o art. 157 do CC, “Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade, ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta”. É no § 1º que se encontra a forma de apreciação da desproporção das prestações, que deverá se dar “segundo os valores vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico”.

Devem estar presentes dois requisitos:

1) requisito objetivo - que é o lucro exagerado, a desproporção das prestações que fornece um dos contratantes;
2) requisito subjetivo - denominado dolo de aproveitamento, que é o aproveitamento consciente da premente necessidade, inexperiência ou leviandade do outro contratante.

A justificativa do instituto da lesão está na proteção ao contratante hipossuficiente ou aquele que em determinada situação se encontra em situação de inferioridade.

No § 2º do referido art. 157 do CC lê-se que “Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito”. Daí se constata que a finalidade da ação judicial contra lesão é o restabelecimento da situação anterior e também que a lei abre a faculdade de se evitar tal deslinde com a complementação ou redução do preço.

“A lesão só é ocorrível nos contratos comutativos, porque nestes deve haver presumida equivalência das prestações. Os contratos aleatórios, em geral, não admitem esse vício, pois suas prestações, por natureza, já se mostram desequilibradas” (Venosa, 2003, 513).

Podem ser enumeradas as seguintes distinções entre a lesão e o estado de perigo:
a) No estado de perigo, o perigo é de vida. Está presente uma situação de risco para o contratante ou pessoas a que se refere a lei. Existe uma necessidade de salvar a si ou a outrem. Na lesão, a necessidade que se mostra não é de salvação e sim pecuniária;
b) No estado de perigo é imprescindível o elemento subjetivo – que o beneficiado perceba o perigo. Na lesão, basta o elemento objetivo – o desequilíbrio das prestações;
c) No estado de perigo anula-se o negócio na sua integralidade e as partes retornam ao estado anterior. Na lesão a lei dá a oportunidade de se evitar a anulação do negócio.

Estado de necessidade ou estado de perigo

Estado de necessidade ou estado de perigo – Art. 156 CC - caracteriza-se “quando alguém, premido da necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa”. Ex: pessoa que se está afogando e, desesperada, promete toda sua fortuna para ser salva. Segundo Venosa (2003, 464) “A questão primordial que se analisa é aquela na qual o indivíduo, de acordo com as circunstâncias, não possui outra saída ou alternativa viável”.

O novo Código ainda admite que “tratando-se de pessoa não pertencente à família do declarante, o juiz decidirá segundo as circunstâncias” - art. 156, parágrafo único do CC.

Observe-se que “No estado de perigo, ao contrário do que ocorre na coação, há uma parte que não é responsável pelo estado em que ficou ou se colocou a vítima. O perigo não foi causado pelo beneficiário, embora ele tome conhecimento da situação. Essa ciência do perigo é essencial para que ocorra o vício. Trata-se, como se nota, de um abuso de situação” Venosa (2003, 465).

Coação

Coação - pressão física ou moral exercida sobre a pessoa, a família, os bens ou a honra de um contratante, para obrigá-lo ou induzi-lo a praticar um ato. Pode ser física (vis absoluta) ou moral (vis compulsiva). No primeiro caso, o ato é nulo para alguns autores e inexistente para outros, pois implica na ausência total de consentimento. No segundo caso, o ato é anulável, pois resta mantida uma liberdade relativa para a vítima: expor-se ao mal cominado ou concluir o negócio que se lhe pretende extorquir.

Requisitos:

1 - Deve ser causa determinante do ato - Se o ato jurídico for realizado de qualquer forma, a coação só gera o direito do coacto pedir perdas e danos (art. 186 CC). Deve, também, existir relação de causalidade entre a ameaça e a declaração, pois se há consentimento independente da ameaça, não houve coação.

2 - Deve incutir no paciente fundado temor - Não basta a mera suspeita da vítima para anular o negócio.

3 - O temor deve se referir a dano atual ou iminente – art. 151 CC – O dano de ser atual ou inevitável sob o prisma da vítima. Se for remoto e distante, evitável pela intervenção da autoridade ou de outra pessoa, não há que se falar em vício.

4 - O dano deve ser grave ou considerável – Importa a intensidade do mal, sua probabilidade (art. 152 CC).

5 - O dano deve recair sobre a pessoa ou os bens do paciente, ou ainda sobre sua família - Admite-se, excepcionalmente, que o dano ameaçado recaia sobre terceiro (Ex.: noivo, amigo etc.) e sobre o próprio coator (Ex.: filho que ameace suicidar, caso o pai não pratique determinado ato), desde que se prove que a ameaça foi suficiente para viciar o consentimento - art. 151, parágrafo único CC.

6 - A ameaça deve ser injusta - Não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, art. 153 CC, (eis que deve ser ela injusta), nem o simples temor reverencial (receio de desgostar pessoas a quem se deve obediência e respeito). Atenção para o abuso de direito – arts. 187 e 188, I do CC.
7 - Intenção de coagir – Ânimo de extrair o consentimento para o negócio.

Coação exercida por terceiro – “Vicia o negócio jurídico a coação exercida por terceiro, se dela tivesse ou devesse ter conhecimento a parte a que aproveite, e esta responderá solidariamente com aquele por perdas e danos” – art. 154 CC. “Subsistirá o negócio jurídico, se a coação decorrer de terceiro, sem que dela tivesse ou devesse ter conhecimento a parte a quem aproveite, mas o autor da coação responderá por todas as perdas e danos do coacto” – art. 155 CC.

Dolo

Dolo - artifício ou expediente astucioso, utilizado para induzir alguém a praticar um ato que o prejudica e aproveita ao autor do dolo ou a terceiro. Distingue-se do erro, porque neste o engano é espontâneo, enquanto no dolo é provocado.

Espécies de dolo:

I - dolus bonus (comportamento lícito e tolerado, que não induz anulabilidade; é o dolo menos intenso; ex: exagero do vendedor nas qualidades do bem que está vendendo) e dolus malus (é o dolo mais intenso e que induz anulabilidade);

II – dolo essencial ou principal (é o que dá causa ao negócio, que não se realizaria de outro modo. Gera a anulabilidade do ato - art. 145 CC) e dolo acidental (é o que acarreta a prática do ato em condições mais onerosas ou menos vantajosas, sendo que, no caso de sua ausência, o ato se realizaria, embora por outro modo. Acarreta apenas a obrigação de reparar o dano – art. 146 CC);

III - dolo positivo (consiste numa conduta comissiva) e negativo (consiste numa conduta omissiva). “Nos negócios jurídicos bilaterais o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado, constitui omissão dolosa, provando-se que sem ela se não teria celebrado o contrato” – art. 147 CC;

IV - dolo de terceiro - é o praticado por terceira pessoa que não seja parte no negócio jurídico. “Pode também ser anulado o negócio jurídico por dolo de terceiro, se a parte a quem aproveite dele tivesse ou devesse ter conhecimento; em caso contrário, ainda que subsista o negócio jurídico, o terceiro responderá por todas as perdas e danos da parte a quem ludibriou” – art. 148 CC. Não pode se falar em dolo de terceiro se a parte “ludibriada” previamente tomou conhecimento do artifício a ser perpetrado por ele.

V - dolo de representante – “O dolo do representante legal de uma das partes só obriga o representado a responder civilmente até a importância do proveito que teve. Se, porém, o dolo for do representante convencional, o representado responderá solidariamente com ele pelas perdas e danos” – art. 149 CC. Cabe ao representado o direito de ajuizar ação regressiva;

VI - dolo de ambas as partes – “Se ambas as partes procederam com dolo, nenhuma pode alegá-lo, para anular o negócio jurídico, ou reclamar indenização” – art. 150 CC.