segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

4º Exercício de Direito Civil II - obrigação alternativa

1. Nas obrigações alternativas, é correto afirmar-se que (TJSC/2002):
a) a escolha cabe sempre ao credor;
b) podem as partes convencionar que a escolha caiba ao credor;
c) inexeqüíveis ambas as obrigações, o credor poderá reclamar o valor de ambas;
d) tornadas impossíveis as prestações, ainda que inexistente culpa do credor, a obrigação de cumpri-las não se extingue;
e) em se tratando de prestações anuais, a opção, uma vez feita, é obrigatória para todas as prestações.

2. No caso de obrigação alternativa, cabendo a escolha ao devedor e, todas as prestações perecerem por culpa do devedor, deverá este:
a) Indenizar o credor pelo equivalente da prestação;
b) Se obrigar a uma nova prestação;
c) Pagar o valor da que por último se perdeu, acrescido de perdas e danos;
d) Pagar o valor de qualquer uma das prestações, acrescido de perdas e danos.

3. Assinale a alternativa FALSA:
a) A coisa incerta será indicada, ao menos, pelo gênero e quantidade;
b) Extingue-se a obrigação de não fazer, desde que, sem culpa do devedor, se lhe torne impossível abster-se do fato, que se obrigou a não praticar;
c) Nas obrigações alternativas, a escolha cabe ao devedor, se outra coisa não se estipulou.
d) N.d.a.

4. No tocante às obrigações alternativas, a Lei Civil estabelece que:
a) O devedor pode pagar, a seu critério, parte em uma prestação e parte em outra;
b) A escolha da prestação cabe ao devedor, podendo o contrato dispor em contrário;
c) O devedor, em se tratando de prestações anuais, somente poderá exercer a opção no primeiro ano;
d) A escolha da prestação cabe sempre ao devedor.

5. Ocorrendo, por culpa do devedor, impossibilidade superveniente de cumprimento de uma das obrigações alternativas de escolha do credor, qual das seguintes hipóteses seria a solução correta?
a) O credor deverá concentrar o débito nas obrigações remanescentes;
b) O credor receberá o equivalente em dinheiro pela obrigação impossibilitada mais perdas e danos;
c) O credor poderá optar entre a concentração do débito em uma das obrigações remanescentes e o equivalente em dinheiro da prestação impossibilitada, mais perdas e danos;
d) Nas obrigações alternativas, a escolha cabe sempre ao devedor, e outra coisa não se pode estipular;

6. A relação obrigacional que contém duas ou mais prestações de dar, de fazer ou de não fazer, decorrentes da mesma causa ou do mesmo título, que deverão realizar-se totalmente, de modo que o inadimplemento de uma envolve o seu descumprimento total, visto que o credor não está obrigado a receber uma sem a outra, denomina-se obrigação:
a) alternativa ou disjuntiva
b) facultativa
c) simples
d) com faculdade alternativa
e) cumulativa ou conjuntiva

7. Nas obrigações alternativas, o direito de escolha:
a) Não havendo estipulação, pertence ao devedor.
b) Não cumprida a obrigação, passa automaticamente ao credor.
c) Retorna ao devedor, quando não interpelado judicialmente o credor ao término do prazo contratual;
d) Inexistindo cláusula em contrário, pertence ao credor, que deverá exercê-lo após prévia notificação do devedor.

Gabarito:
1-b, 2-c, 3-d, 4- b, 5-c, 6-e, 7-a.

3º Exercício de Direito Civil II - fazer e não-fazer

3ª LISTA DE EXERCÍCIOS DE DIREITO CIVIL II – (OBRIGAÇÃO DE FAZER)
PROF.ª PATRICIA DONZELE


1. No que se refere à promessa de fato de terceiro, assinale a alternativa INCORRETA:
a) O terceiro não pode ser obrigado pela avença; se o contratante não obtiver o fato prometido, responderá por perdas e danos;
b) O fato de terceiro é o objeto da prestação da avença;
c) A obrigação do promitente é uma obrigação de meio, de envidar o melhor dos seus esforços para conseguir a prestação;
d) Nessa promessa, o terceiro cumpre uma obrigação assumida pelo promitente;

2. Foi contratada uma empresa para fazer a laje de concreto de um prédio. Caracterizada a recusa e a mora, bem como a urgência:
a) Poderá o credor, independentemente de autorização judicial, contratar terceiro para executar a tarefa, podendo pleitear, depois, a devida indenização.
b) Poderá o credor, independentemente de autorização judicial, contratar terceiro para executar a tarefa, não tendo direito de pleitear, depois, a indenização.
c) Não poderá o credor, sem a autorização judicial, contratar terceiro para executar a tarefa.
d) Não poderá o credor, através de liminar, contratar terceiro para executar a tarefa.

3. Um palhaço foi contratado para animar uma festa de aniversário e, no dia do evento, foi vítima de seqüestro. Assim:
a) A obrigação se extingue por caso fortuito, sem dever de indenizar pelo palhaço.
b) A obrigação se extingue por caso fortuito, com dever de indenizar pelo palhaço.
c) A obrigação não se extingue e o palhaço deve animar outra festa indicada pelo contratante.
d) A obrigação não se extingue e o palhaço deve pagar outro palhaço que lhe substituiu na animação da festa.

4. Natália, dona de uma loja de produtos de beleza, promete que os futuros adquirentes da loja manterão o direito de exclusividade concedido ao fornecedor. Ocorre que Augusta comprou a loja de Natália e não firmou este compromisso com ela, nem tem intenção de cumpri-lo. Diante desta situação é correto dizer:
a) Resolve-se a obrigação entre o fornecedor e Natália, devido a impossibilidade de seu cumprimento.
b) Converte-se a obrigação de fazer em obrigação de dar.
c) O fornecedor poderá obter a execução direta da obrigação, pois esta não é intuitu personae.
d) Natália não pode ser obrigada a indenizar, pois o adimplemento da obrigação agora depende de Augusta.

5. Havendo inadimplemento de obrigação de fazer de caráter personalíssimo (obrigação intuitu personae) por impossibilidade de o devedor não culpado cumpri-la, qual a mais adequada, dentre as alternativas?
a) O devedor responde pelos prejuízos sofridos pelo credor;
b) Resolve-se por perdas e danos;
c) As alternativas anteriores estão corretas;
d) O credor manda, por ordem judicial, executar o ato contratado;
e) Nenhuma das alternativas anteriores;

6. Considerando o seguinte caso hipotético: José, famoso pintor de quadros, em data de 18.03.2002, efetuou negócio com Mário, em que ficou instituída obrigação de fazer, ou seja, José comprometeu-se que até a data de 15.06.2002 pintaria e entregaria o retrato de Mariquinhas, filha mais velha de Mário. Na ocasião em que fecharam o negócio, ficou estabelecido que o valor do trabalho seria de R$500,00 (quinhentos reais), e que o pagamento seria efetuado na data da entrega da referida pintura. Ocorre, porém, que decorrido o prazo para entrega da pintura, José não cumpriu o avençado, ou seja, não entregou o quadro a Mário. Diante disto Mário foi procurá-lo, para que o mesmo cumprisse a sua parte no negócio, sendo certo que José informou que não mais iria entregar a pintura, pois Mariquinhas era uma moça muito feia e não merecia ser pintada por ele. Assinale a alternativa correta:
a) Mário poderá usar sua força física e obrigar José a pintar o quadro, objeto da obrigação de fazer;
b) José deverá indicar outro pintor da mesma categoria para substituí-lo e Mário será obrigado a aceitar a substituição, pois se trata de obrigação de fazer;
c) José poderá ser obrigado a indenizar (perdas e danos) Mário, pois se trata de obrigação de fazer;
d) Mário deve obrigar José a casar-se com Mariquinhas, pois chamando-a de feia desonrou a moça.

7. Assinale a alternativa falsa:
a) o credor de coisa certa estará obrigado ao recebimento de outra coisa, desde que mais valiosa, porque a obrigação de dar coisa certa não lhe abrange os acessórios, quando não mencionados, salvo se contrariamente resultar do título ou das circunstâncias do caso;
b) mesmo quando incerta a coisa objeto da obrigação de dar, ela será indicada, ao menos, pelo gênero e quantidade, caso em que pertencerá a escolha ao devedor, que todavia não poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor;
c) na obrigação de fazer, se a prestação do fato se impossibilitar sem culpa do devedor, resolver-se-á a obrigação, e, por culpa do devedor, responderá ele pelas perdas e danos;
d) a extinção da obrigação de não fazer ocorre quando, sem culpa devedor, lhe seja impossível abster-se do fato que se obrigara a não praticar.

8. Assinale a opção que lhe pareça mais adequada:
a) Na obrigação de fazer, o credor não é obrigado a aceitar de terceiro a prestação, quando for convencionado que o devedor a faça pessoalmente;
b) Na obrigação de fazer, se a prestação do fato se impossibilitar sem culpa do devedor, resolver-se-á a obrigação; se por culpa do devedor, responderá este pelas perdas e danos;
c) Na obrigação de fazer, incorre também na obrigação de indenizar perdas e danos o devedor que recusar a prestação a ele só imposta, ou só por ele exeqüível.
d) Na obrigação de fazer, se o fato puder ser executado por terceiro, será livre ao credor mandá-lo executar à custa do devedor, havendo recusa ou mora deste, ou pedir indenização por perdas e danos;
e) todas as alternativas anteriores estão corretas.

9. Assinale a opção incorreta:
a) Obrigação de fazer é aquela em que o devedor se compromete a executar algo em benefício do próprio credor ou de terceiro.
b) A obrigação de fazer pode ser pura, quando consistirá apenas em realizar algo, ou não-pura, quando envolverá também o ato de entrega.
c) É possível utilizar-se da busca e apreensão quando a obrigação de fazer for não-pura.
d) N.d.a.

10. Assinale a opção incorreta:
a) A tutela específica da obrigação de fazer não é possível porque se trata de liberdade individual.
b) Se a prestação tornar-se impossível por culpa do devedor, caberá sempre perdas e danos.
c) Havendo mora do devedor em prestar obrigação fungível, fica o credor livre de mandar executar o serviço à conta dele.
d) N.d.a.

Gabarito:
1-c, 2-a, 3-a, 4-b, 5-e, 6-c, 7-a, 8- e, 9-d, 10- d.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Garantia de emprego do deficiente ou reabilitado (Sergio Pinto Martins)

Reza o inciso XXXI do artigo 7.º da Constituição sobre a proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de admissão do trabalhador com deficiência.

A Convenção n.º 159 da OIT, de 1983, promulgada pelo Decreto n.º 129/91, versa sobre a reabilitação e emprego da pessoa portadora de deficiência.  Os países devem introduzir, nos seus ordenamentos jurídicos, políticas de readaptação profissional e emprego de pessoas com deficiência, visando garantir adequadas medidas de readaptação profissional sejam colocadas à disposição de deficientes, promovendo oportunidades de emprego, tendo por base também o princípio da igualdade de oportunidades de emprego. A Recomendação 168 da OIT trata de diretrizes para a adoção de políticas para inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho.

Nem toda pessoa deficiente é incapaz para o trabalho. Nem toda pessoa incapaz é deficiente.

Dispõe o artigo 93 da Lei n.º 8.213/91 que "A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:

I - até 200 empregados.......... 2%;
II - de 201 a 500.................... 3%;
III - de 501 a 1.000............... 4%;
IV - de 1.001 em diante. ....... 5%.

É o que a doutrina chama de sistema de "cotas", pois também há cotas para admissão de aprendizes na empresa (art. 429 da CLT). A empresa tem que cumprir as cotas de admissão de deficientes ou de pessoas reabilitadas, sob pena de multa administrativa.    


A dispensa de trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias, e a imotivada, no contrato por prazo indeterminado, só poderá ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante §1.º do art. 93 da Lei n.º 8.213/91). O Ministério do Trabalho e da Previdência Social deverá gerar estatísticas sobre o total de empregados e as vagas preenchidas por reabilitados e deficientes habilitados, fornecendo-as, quando solicitadas, aos sindicatos ou entidades representativas dos empregados (§2.º do art. 93 da Lei n.º 8.213/91).
A determinação do parágrafo 1.º artigo 93 da Lei n.º 8.213/91 não é uma garantia individual ou para uma pessoa específica, mas para um grupo de pessoas deficientes.

Estabeleceu situação compreendendo condição suspensiva: admissão de empregado de condição semelhante. Trata-se de hipótese de garantia de emprego indireta em que não há prazo certo. A dispensa do trabalhador reabilitado ou dos deficientes só poderá ser feita se a empresa tiver o número mínimo estabelecido pelo artigo 93 da Lei n.º 8.213/91. Enquanto a empresa não atinge o número mínimo previsto em lei, haverá garantia de emprego para as referidas pessoas. Admitindo a empresa deficientes ou reabilitados em porcentual superior ao previsto no artigo 93 da Lei n.º 8.213/91, poderá demitir outras pessoas em iguais condições até atingir o referido limite. Poderá, porém, a empresa dispensar os reabilitados ou deficientes por justa causa.

Representa o parágrafo 1.º do artigo 93 da Lei n.ª 8.213/91 hipótese de limitação ao poder potestativo de dispensa do empregador.

A pessoa com deficiência deve ser habilitada. Se não houver habilitados no mercado, não há como a empresa os admitir e cumprir a regra do artigo 93 da Lei n.º 8.213/91.

A lei faz referência a empregado reabilitado ou deficiente contratado por prazo determinado de mais de 90 dias. Assim, se o contrato de prazo determinado for de até 90 dias, como ocorre com o contrato de experiência, não há direito a garantia de emprego.

O cálculo das cotas é feito com base no número de empregados da empresa e não de cada estabelecimento. A empresa pode ter um número menor de empregados em cada estabelecimento do previsto no artigo 93 da Lei n.º 8.213, mas o cálculo é feito com base no número total de empregados da empresa. A lei não estabeleceu distinção em relação a atividade exercida pela empresa para excluir a aplicação das cotas.

Outro dia verifiquei a Prefeitura Municipal do Guarujá colocou deficientes de locomoção para atender o público na recepção, o que eles podem fazer muito bem, pois não depende de locomoção.

O cego não pode dirigir veículo automotor, mas pode atender telefone e fazer outras funções, o que faz muito bem.

Em caso de justo impedimento para a contratação de deficiente, em que a empresa demonstrou que envidou esforços na busca por candidatos para preenchimento das vagas para deficientes físicos habilitados e/ou reabilitados do INSS, mas que, todavia, não obteve êxito na tentativa de admissão desses trabalhadores. Foram enviados ofícios ao Sine, ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Unaí e ao INSS. O cumprimento da obrigação legal se tornou impossível em virtude da inexistência de apresentação ou indicação de trabalhadores portadores de deficiência ou reabilitados. A interpretação da lei não pode levar ao impossível.

O Direito também não pode ignorar a realidade, impondo obrigação impossível de ser cumprida. Ficou mantido o julgado de primeiro grau:
Agravo de instrumento. Recurso de revista. Auto de infração. Nulidade. Justa impossibilidade de cumprimento da legislação. Art. 93 da Lei n.º 8.213/91. Nega-se provimento a agravo de instrumento que visa liberar recurso despido dos pressupostos de cabimento. Agravo desprovido (TST, 2ª T., AIRR 53.240-54.2007.5.03.0096, j. 6.9.11, Rel. Min. Renato de Lacerda Paiva, DJe 16.9.11), IOB 2/30043, n.° 19/2011, p. 554).

O artigo 93 da Lei n.º 8.213/91 faz referência a cargos. Empresa privada não tem cargo. Cargo é privativo de funcionário público. Entretanto, a lei não faz distinção em relação ao tipo de cargo. Logo, não trata de postos de trabalho passíveis que comportem a admissão de deficientes, mas do total de postos existentes na empresa. No mesmo sentido o seguinte julgado:
AÇÃO DECLARATÓRIA DE ANULAÇÃO DE DÉBITO FISCAL. Cota para deficientes. A determinação de observância da cota de deficientes e\ou reabilitados é endereçada a toda empresa com mais de 100 empregados, não fazendo qualquer exceção. . Pretender que o percentual previsto na lei, em comento, para contratação de portadores de deficiência somente seja calculado sobre o total de postos funcionais compatíveis a portadores de deficiência existentes na empresa e não sobre o total de cargos ali existentes, não é possível admitir, já que é função do legislador criar o direito. Caso fosse julgada procedente a pretensão, o Poder Judiciário estaria se valendo da condição de legislador, incluindo exceção na norma que não existe. APELO PROVIDO (TRT 2ª R., Rel. Maria Aparecida Duenhas, DJ 27.5.2011).

Jornal Carta Forense, domingo, 12 de fevereiro de 2012

Afetividade no além-mar? (José Fernando Simão)

Depois da difícil de defesa da minha tese de livre-docência que, na Universidade de São Paulo, é o concurso de maior duração e que contém o maior número de avaliações pela banca (defesa de tese, prova escrita, prova didática, análise de memoriais), resolvi viajar para recarregar as baterias.

Qual não foi minha surpresa ao chegar em Lisboa no dia 23 de janeiro e ler em no jornal Correio da Manhã que: "OBRIGADO A SER PAI DE FILHA ALHEIA ".

Li a reportagem toda que cuidava de uma ação julgada pelo Tribunal da Relação de Coimbra em que o pai de uma menina propunha uma ação negatória de paternidade alegando que não era seu pai biológico por ser infértil.  A matéria dizia, ainda, que o autor da demanda sabia que a filha não era sua desde o nascimento da criança, conhecendo, inclusive, o fato de a mãe da menina, sua esposa, ter mantido relações extraconjugais.

Seguem algumas linhas da publicação:
"António (nome fictício) tem uma 'filha' de 17 anos com o seu apelido, mas sabe que não é o pai, por ser infértil e nem sequer ter tido relações sexuais com a mãe desta. Para repor a "verdade biológica" e retirar o seu nome da certidão de nascimento, recorreu ao tribunal, mas o seu pedido não foi aceite, por ter sido feito fora de prazo. Ainda tentou provar a inconstitucionalidade dessa norma, mas de nada lhe valeu.

O queixoso, que reside no concelho de Condeixa-a-Nova, era casado, mas a mulher (e mãe da rapariga) 'recusava-se a ter relações sexuais" com ele, pois "mantinha um relacionamento amoroso e sexual" com outro homem. António sempre soube que a menor não era sua filha. Acabaria por se divorciar da mulher, mas nessa altura o seu nome já figurava na certidão de nascimento como sendo o pai. Foi deixando passar o tempo, e quando apresentou, junto do Tribunal de Condeixa, uma acção de impugnação da paternidade, a menor já tinha 13 anos, quando a lei prevê um prazo de três anos para o fazer,' contados desde a data em que teve conhecimento".

Apesar de velada, da notícia transparecia a indignação do periódico luso. Como pano de funda, ficava uma indagação? Como fazer com que um homem que não era pai biológico, fosse pai para todos os efeitos jurídicos?

Fato é que além da questão do prazo decadencial (em Portugal denominado caducidade), o Tribunal de Coimbra mencionou (segundo a reportagem), que há outros fatores a serem considerados na formação da paternidade.

Um pouco antes de viajar a Portugal, em minha aula de revisão para Concursos no Curso Damásio, mencionei uma decisão do STJ que reforça a prevalência do vínculo afetivo sobre o biológico. Confirma-se no meu twitter (@professorsimao). Basta lançar o seguinte link http://bit.ly/nu42W6
Enquanto o Código Civil de 2002 não traz prazos para a negatória de paternidade (como trazia o revogado Código) porque o artigo 1601 é claro neste sentido (Art. 1.601. Cabe ao marido o direito de contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher, sendo tal ação imprescritível), o Código Português traz o prazo decadencial 3 anos.

A grande pergunta é: sendo a ação proposta no prazo de 3 anos (em Portugal) ou a qualquer tempo (no Brasil), a paternidade deve ser desconstituída quando o DNA atestar a ausência de vínculo biológico?

A resposta é negativa em razão do afeto que gera efeitos jurídicos na constituição de vínculos. Então surge outra questão. Se o menor ou o adolescente tiver um pai biológico que desconhecia o fato de ser pai (a mãe da criança omitiu a gravidez e o nascimento) e um pai socioafetivo que, sabendo não ser pai biológico desenvolveu o vínculo (seguindo o trinômio nomen, tractatus e fama), terá o pai biológico direito ao reconhecimento da paternidade?

Se a resposta for positiva, desfeita será a parentalidade socioafetiva e reconhecida a biológica (DNA vence o afeto). Se a resposta for negativa, prevalece o vínculo afetivo, mas o pai biológico ficará alijado da condição de pai (Afeto vence o DNA).

Alguns se perguntam: e por que não se admitir pluriparentalidade? Maurício Bunazar, em artigo premiado apresentado no Congresso Paulista do IBDFAM ("Pelas portas de Villella - um ensaio sobre a pluriparentalidade como realidade sócio-jurídica"), responde ser possível a aceitação desta pluriparentalidade. Não estou convencido disto.

Afirmar que a pluriparentalidade atende ao melhor interesse da criança é discurso ideológico e vazio. Pode ou não atender. Mas, pior que isto, o argumento constitucional só aplica à criança e ao adolescente. Então não haveria possibilidade de pluriparentalidade para as pessoas maiores? Bem, a saída é invocar o princípio da dignidade da pessoa humana que tem servido de panacéia a todos os males.

Aliás, para os que se utilizam do discurso principiológico de maneira vazia um lembrete. O Ato Institucional n. 5, de 13 de dezembro de 1968, uma das maiores agressões já perpetradas à democracia e à liberdade individual na história recente do Brasil, em sua justificativa afirmava: "CONSIDERANDO que a Revolução brasileira de 31 de março de 1964 teve, conforme decorre dos Atos com os quais se institucionalizou, fundamentos e propósitos que visavam a dar ao País um regime que, atendendo às exigências de um sistema jurídico e político, assegurasse autêntica ordem democrática, baseada na liberdade, no respeito à dignidade da pessoa humana, no combate à subversão e às ideologias contrárias às tradições de nosso povo, na luta contra a corrupção, buscando, deste modo, 'os meios indispensáveis à obra de reconstrução econômica, financeira, política e moral do Brasil, de maneira a poder enfrentar, de modo direito e imediato, os graves e urgentes problemas de que depende a restauração da ordem interna e do prestígio internacional da nossa pátria'".

Em suma, a questão do afeto como valor jurídico ainda engatinha. Há muito a se discutir sobre o tema. Cabe um sério aprofundamento teórico com bases sólidas a fornecer balizas para os nossos julgadores. Mas enquanto isso, no além-mar o tema palpita e vira manchete de jornal.

Jornal Carta Forense, domingo, 12 de fevereiro de 2012