Mais uma arma contra a violência doméstica, a responsabilização
financeira dos agressores, começa a se tornar realidade no país. Saiu a
primeira sentença judicial do Brasil condenando um homicida enquadrado
na Lei Maria da Penha a reembolsar o Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS) pelos valores gastos pela União no pagamento da pensão devida
aos dois filhos menores da mãe assassinada.
O alvo da ação é Hélio Beckmann, que está preso por matar, com 11
facadas, a ex-mulher Marta Iraci Rezende da Silva. Ela tinha 40 anos na
época do crime, em 2009, ocorrido em Teutônia, a cerca de 100
quilômetros de Porto Alegre. A Previdência projetou em R$ 89.115,30 os
desembolsos já feitos a título de pensão somados às parcelas que ainda
serão pagas mensalmente até que os filhos da vítima completem 21 anos.
Mas a defesa de Beckmann conseguiu diminuir a quantia devida. Ele terá
de pagar 20% do montante, cerca de R$ 18 mil, segundo sentença expedida
em 1º de fevereiro pela Justiça Federal do Rio Grande do Sul.
Apesar da diminuição drástica do valor pleiteado pelo INSS, que
ajuizou a ação contra Beckmann, tanto o governo quanto especialistas na
área de defesa dos direitos da mulher comemoram a decisão. Advogada e
assessora do Centro Feminista da Estudos e Assessoria (Cfemea), Luana
Basílio destaca o impacto “simbólico e cultural” da decisão. “Não é o
valor em si o aspecto mais importante, mas o reconhecimento da obrigação
de ressarcir o Estado. Isso abre um precedente importante para novas
ações”, afirma.
Jorge Luiz Garcez Souza, advogado de Beckmann, afirma que vai
recorrer da decisão. “Se a mulher fazia o recolhimento previdenciário, é
dever do INSS pagar, não do meu cliente. Além disso, ainda será julgado
recurso em relação à condenação criminal, pois pedimos anulação do júri
e insistimos na tese da legítima defesa”, diz Garcez.
A argumentação, entretanto, não convenceu o juiz Rafael Wolff. Ele
assinalou, no relatório que acompanha a sentença, que o “laudo de
necropsia demonstra a existência de 11 facadas profundas, o que comprova
um ataque movido por ódio, e não um infortúnio decorrente do exercício
de legítima defesa”.
Juizados Auxiliar da Comissão de Acesso à Justiça e Cidadania do
Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a juíza Luciane Bortoleto reconhece
as dificuldades ainda presentes na aplicação da Lei Maria da Penha,
sancionada há seis anos. Levantamento do CNJ em fase de conclusão
mostra, por exemplo, que o Brasil conta apenas com 63 juizados
especializados em violência contra a mulher.
São Paulo, Rio de Janeiro e Distrito Federal se destacam com uma
boa cobertura de juizados, segundo Luciane. “No restante do país ainda
falta avançar”, afirma a juíza, sem detalhar números. Há juizados não
exclusivos – que atendem outras áreas específicas, como as agressões
contra idosos e crianças, além da violência contra a mulher – e os
criminais comuns, que processam qualquer ação desse tipo. “Ter um
juizado exclusivo significa ter uma equipe psicossocial, e isso faz toda
a diferença. Cria-se um ambiente melhor de atendimento, levando
credibilidade e encorajando mais mulheres a procurar ajuda”, diz
Luciane.
De acordo com o Mapa da Violência, o número de mortes de mulheres
por agressão passou de 1.353 em 1980 para 4.297 em 2010 – aumento de
217%. A taxa de óbitos por 100 mil mulheres saltou de 2,3 para 4,4 no
mesmo período. O estudo mostrou ainda que 68% das vítimas morreram em
casa, o que sinaliza o elevado grau de violência doméstica.
Mais ações A Advocacia Geral da União (AGU) informou, por meio da
assessoria de imprensa, que aguardava a primeira decisão judicial nesse
sentido para entrar com novos processos de ressarcimento contra
agressores de mulheres – o que deve ocorrer ainda no primeiro semestre
deste ano. Prejuízo para ser cobrado é o que não falta, já que o INSS
estima em R$ 30 milhões os gastos anuais com pensões por morte e
auxílios-doença gerados pela violência doméstica no Brasil.
18/02/2013
- Fonte: Estado de Minas
http://www.ibdfam.org.br/novosite/imprensa/direito-de-familia-na-midia/detalhe/6775
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