O título deste artigo já por si deveria provocar
todos os nossos alarmes e cuidados. É certo que, contemporaneamente, na moderna
teoria e dogmática constitucional, poucos colocam em questão o fato de que não
possa existir hierarquia entre os direitos fundamentais. Num quadro em que o
próprio poder constituinte — é o caso do Brasil — se eximiu de estabelecer
qualquer prevalência — em abstrato — de qualquer dos bens tutelados por normas
de direitos fundamentais, consentir com que tal hierarquia fosse fixada por
órgãos que têm apenas a função de interpretar e concretizar a Constituição
seria — em antiga advertência de Francisco Campos — aceitar que esses órgãos
tivessem primazia sobre o próprio poder constituinte.
Infelizmente, contudo, a conclusão de ausência de
hierarquia entre direitos fundamentais — que é correta — acabou vulgarizando a
ideia de que direitos fundamentais tão importantes — como a vida — podem ser
preteridos sem maior consideração e de forma precipitada. A ideia de que o
direito à vida, por exemplo, possa, em situações extremas, ceder diante de
outros bens constitucionalmente protegidos não pode ser confundida com a
certeza hoje já popularizada de que essa preterição possa ser promovida de
forma imprudente e irrefletida.
Para ficar em exemplo conhecido, a afirmação
genérica e abstrata de que o direito à liberdade e de autodeterminação da
mulher prevaleceria sempre e sempre sobre o direito à vida no caso do aborto é
uma dessas precipitadas generalizações que temos o dever constitucional de
evitar. A vida pode ceder diante de outros direitos fundamentais — isso é certo
—, mas apenas em situações excepcionalmente fundamentadas, em que a carga
argumentativa se manifeste induvidosamente a favor de outros direitos
fundamentais. Para nosso infortúnio, contudo, nesse terreno de colisões de
direitos fundamentais, os casos de fácil e de evidente solução são menos comuns
do que as respostas arbitrárias e ligeiras que acabam suscitando.
(...)
Leia a íntegra em: http://www.conjur.com.br/2013-fev-18/constituicao-poder-prevalencia-liberdade-religiosa-direito-vida2
Néviton Guedes é desembargador federal do TRF da 1ª Região e doutor em Direito pela Universidade de Coimbra.
Revista Consultor Jurídico, 18 de fevereiro de 2013
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