A multiparentalidade, que é um caminho sem volta na modernização do direito de família, será pauta de vários julgamentos.
O direito de família vem passando por inúmeras modificações com o
passar dos anos, e o conceito de família vem se ampliando para abranger
as mais diversas formas de núcleos familiares existentes hoje em dia. É
nesse contexto, observando que o divórcio vem se tornando algo cada vez
mais comum e frequente, é que surge o tema da multiparentalidade.
A título exemplificativo é possível imaginarmos a seguinte situação:
uma menina cujos pais biológicos são divorciados perde a mãe biológica
ainda na infância, sendo criada a vida toda pelo pai e pela madrasta.
Cria-se entre a madrasta e a enteada um vínculo socioafetivo,
estabelecido pelo laço de amor e de cuidado, laço este que perdura ao
longo da vida em uma exímia relação maternal. Seria possível que esta
menina ou que a madrasta requeressem a declaração da maternidade
socioafetiva e inclusão em seu registro civil mantendo o nome da
falecida mãe biológica?
Trata-se apenas de uma possibilidade, entre tantas outras, em que o
assunto da multiparentalidade vem à tona. A Lei 11.924/2009 já
regulamentou a possibilidade de o enteado ou enteada adotar o
patronímico da família do padrasto ou da madrasta, porém a questão da
multiparentalidade vai além, e questiona-se se seria possível alguém ter
em seu registro civil o nome de duas mães ou de dois pais.
Sobre o tema não há consenso doutrinário, sobretudo no que tange à
questão sucessória e alimentar, porém grande parte dos doutrinadores
modernos é favorável a essa possibilidade, como o professor Flávio
Tartuce¹, que afirma que a multiparentalidade é um caminho sem volta na
modernização do direito de família e que representa uma consolidação da
afetividade como princípio jurídico em nosso sistema.
Embora também não haja jurisprudência consolidada acerca do assunto, em
agosto de 2012 a 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo inovou ao julgar procedente a apelação cível
0006422-26.2011.8.26.0286, interposta em ação declaratória de
maternidade socioafetiva, declarando a maternidade socioafetiva
concomitantemente com a maternidade biológica.
O relator, desembargador Alcides Leopoldo e Silva Junior, em caso
semelhante ao exemplificado acima, mencionou que não haveria qualquer
tipo de reprovação social em se declarar legalmente a maternidade
socioafetiva concomitantemente com a biológica. Citou por base decisão
do STJ que reconheceu a possibilidade de adoção por duas mulheres,
equiparando a multiparentalidade à dupla adoção.
Nesse contexto, levando em consideração o princípio da dignidade da
pessoa humana, bem como a afetividade, a solidariedade e a idéia de
família contemporânea plural, é provável que surjam novas decisões nesse
sentido, consagrando a tendência do direito de família de se adaptar a
uma nova realidade social, buscando assegurar direitos
constitucionalmente protegidos.
Referências Bibliográficas
¹ - TARTUCE, Flávio. O princípio da afetividade no direito de família. In: http://www.ibdfam.org.br/novosite/artigos/detalhe/859
PIOLI, Roberta Raphaelli. Multiparentalidade: alguém pode ter dois pais ou duas mães em seu registro civil?. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3528, 27 fev. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23828>. Acesso em: 26 mar. 2013.
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