A venda de bens de um casal a preço abaixo do mercado logo antes do
divórcio é nula. Assim decidiu, por unanimidade, a 3ª Turma do Superior
Tribunal de Justiça, ao reconhecer a uma mulher o direito à partilha de
bens que haviam sido vendidos pelo ex-marido. Ele havia repassado a seus
irmãos três fazendas com valor de mercado de R$ 6 milhões por apenas R$
220 mil. Eles eram casados em regime de comunhão parcial de bens.
O ministro Villas Bôas Cueva (foto), relator do caso,
considerou que não cabia à corte avaliar o negócio jurídico, mas sim ver
se foi feita alguma simulação (violação do artigo 102 do Código Civil
de 1916, correspondente ao artigo 167, parágrafo 1º, I e II, do CC de
2002) com o intuito de reduzir o patrimônio a ser partilhado.
De
acordo com as provas do processo, bens do casal foram transferidos pelo
ex-marido a seus irmãos pouco antes da separação do casal — quando a
sociedade do casamento ainda não havia sido desfeita pelo divórcio. A
ex-mulher propôs ação ordinária contra seu antigo companheiro porque
este passara ao nome dos irmãos, por R$ 220 mil e sem que ela
concordasse, três fazendas avaliadas em mais de R$ 6 milhões. A venda
aconteceu sob o regime da comunhão parcial de bens, que vem do Código
Civil de 1916.
Na ação, a ex-mulher afirmou que a ação do
ex-marido teve a finalidade de excluir tais bens da partilha quando da
separação judicial, o que demonstrou “desvio patrimonial e consequente
ineficácia das escrituras de transmissão, tendo em vista a subtração de
sua meação por manifesta simulação, o que implica nulidade absoluta do
negócio, à luz do artigo 167 do atual Código Civil”.
Má-fé
O Tribunal de Justiça de São Paulo havia reformado integralmente a
sentença de procedência da ação, que havia declarado o direito à metade
dos bens pela autora da ação sobre os bens comprados por seu ex-marido
durante o casamento, bem como o direito à renda no período entre a
separação de fato do casal e a sentença, em virtude do uso exclusivo do
patrimônio.
A corte entendeu que não houve má-fé no caso, o que
não seria capaz de anular as vendas, tendo em vista o cumprimento das
formalidades na época em que as escrituras foram lavradas. Para os
desembargadores, a ação proposta pela autora seria inadequada, pois os
direitos dos cônjuges decorreriam do próprio regime de casamento e a
discussão deveria ser feita na ação de partilha, própria para questões
de patrimônio.
A simulação retratada nos autos, segundo o relator
do recurso, ministro Villas Bôas Cueva, “reflete artimanha muitas vezes
utilizada em separações litigiosas para ocultar o conteúdo real do ato
praticado e dificultar a prova de violação da ordem jurídica”. Segundo
Cueva, “a alienação forjada, próxima ao desenlace, é, sobretudo, uma
violação da ordem pública — porquanto vedada por lei imperativa que
garante não apenas o direito à meação na separação judicial, mas também o
direito de terceiros credores — e, por óbvio, pode ser reconhecida em
ação autônoma”, acrescentou.
Os bens adquiridos entre a data do
casamento e a separação de fato, de acordo com o relator, devem ser
partilhados nos termos da sentença, segundo a qual a autora conseguiu
provar que a alienação do conjunto de bens pelo seu ex-cônjuge foi
viciada. “A nulidade foi devidamente provada”, concluiu o ministro. Para
Villas Bôas Cueva, o questionável preço dos bens alienados, o
parentesco entre os negociantes, a proximidade da alienação com a
separação e a relatividade da presunção de veracidade do conteúdo das
escrituras públicas demonstram que a ação foi bem solucionada pelo juízo
de primeiro grau, que constatou o fato de a alienação dos imóveis ter
sido efetuada por valor muito abaixo do praticado do mercado. Com informações da assessoria de imprensa do STJ.
Revista Consultor Jurídico, 24 de novembro de 2014, 18h12
http://www.conjur.com.br/2014-nov-24/vender-bens-casal-antes-divorcio-nao-impede-partilha
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