quarta-feira, 22 de junho de 2016

Dano Ricochete, Dano In Re Ipsa e Dano Bumerangue. Breves considerações em torno das espécies de dano na Responsabilidade Civil.

Publicado por Ingryd Monteiro

Antes das considerações sobre espécies de dano, é indispensável iniciar com uma breve conceituação da responsabilidade civil. A obrigação trabalhada no direito obrigacional é um dever jurídico originário, sendo a responsabilidade um dever sucessivo ou secundário, que advém do inadimplemento ou descumprimento de um dever jurídico originário. Pode ser tanto extracontratual, da própria lei (fonte imediata e abstrata) quanto contratual através de uma manifestação de vontades. Ressaltando o contexto histórico com o tão citado BRINZ[1], que desenvolveu a teoria dualista do vínculo obrigacional e a diferença entre Schuld (débito ou obrigação) e Haftung (responsabilidade). Ou seja, “toda conduta humana que, violando dever jurídico originário, causa prejuízo a outrem é fonte geradora de responsabilidade civil”. Com a evolução do direito, a função da responsabilidade é de reparar o dano de forma LexPoetelia Papiria [2]incidindo sobre os bens do responsável pelos atos.
Visto isto, o tema abordado será um dos pressupostos essências para a existência da responsabilidade civil: Art. 186,CC/02: Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Somente com a literalidade da lei, já é perceptível os pressupostos, a conduta culposa (em regra), que deu causa (através do nexo de causalidade – liame entre conduta e resultado) e por último, o dano que viola o direito de outrem, que pode ser material ou moral.
Vem sendo consolidado nas jurisprudências, espécies importantes a serem analisadas:

1. Dano Ricochete

Também chamado de reflexo ou indireto, a ofensa é direcionada inicialmente a uma determinada pessoa, porém os efeitos são sentidos por outra intimamente ligada a ela (vínculo de parentesco).
Para ilustrar, cabe analisar o que ocorre no caso concreto:
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO. DANO EM RICOCHETE. Comprovado o dano, o nexo de causalidade e a culpa empresária, que manteve o trabalho em local interditado ou embargado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, sem as medidas preventivas a evitar a ocorrência de acidente de trabalho que vitimou o empregado, é mantida a condenação solidária das reclamadas pelo pagamento de indenização por danos morais e materiais aos familiares do "de cujus".
(TRT-4 - RO: 00684007920055040026 RS 0068400-79.2005.5.04.0026, Relator: JOÃO BATISTA DE MATOS DANDA, Data de Julgamento: 27/02/2014, 26ª Vara do Trabalho de Porto Alegre)
"4. Não obstante a formação de um novo grupo familiar com o casamento e a concepção de filhos, o poderoso laço afetivo que une mãe e filho não se extingue, de modo que o que se observa é a coexistência de dois núcleos familiares, em que o filho é seu elemento interseccional, sendo correto afirmar que os ascendentes e sua prole integram um núcleo familiar inextinguível para fins de demanda indenizatória por morte. Assim, tem-se um núcleo familiar em sentido estrito, constituído pela família imediata formada com a contração do matrimônio, e um núcleo familiar em sentido amplo, de que fazem parte os ascendentes e seu filho, o qual desponta como elemento comum e agregador dessas células familiares."(Acórdão do Recurso Especial nº 1.095.762 - SP)

2. Dano “in re ipsa”

Para o cometimento do dano, basta a violação do direito inerente a pessoa, assegurados na Constituição, os direitos de personalidade, consequentemente a honra objetiva e a própria dignidade humana. É em síntese, o dano moral presumido, prescinde de comprovação de culpa. Basta que se obtenha o ato ilícito e o nexo de causalidade. Nos exemplos cotidianos, pode ser citado a inscrição indevida no Serasa, extravio de bagagem e em decisões consolidadas dos tribunais caracterizam também o atraso reiterado no pagamento de salários. O fato por si só, caracteriza a violação, invertendo o ônus da prova. Levando a ideia da culpa contra a legalidade, dentre as espécies de culpa. Exclui a responsabilidade, se o causador do dano provar caso fortuito, força maior ou culpa exclusiva da vítima ou de terceiro. Importa ressaltar o que infere Sérgio Cavalieri Filho, “a culpa presumida foi o mecanismo encontrado para favorecer a posição da vítima”, ou seja, equilibrar os lados da relação, para que o lesado não se encontre em uma situação de vulnerabilidade.
RECURSO ORDINÁRIO. DANO MORAL. ATRASO NA QUITAÇÃO DOS SALÁRIOS. DANO IN RE IPSA. Ao empregador incumbe efetuar tempestivamente o pagamento de salários, que, destaque-se, possui natureza alimentar. Por óbvio, que o atraso em sua quitação impede que o trabalhador possa arcar com os custos de sua subsistência, restando
configurado o dano in re ipsa - dano presumido, o qual independe de comprovação.
(TRT-1 - RO: 00105940720145010042 RJ, Relator: CLAUDIA DE SOUZA GOMES FREIRE, Data de Julgamento: 04/08/2015, Nona Turma, Data de Publicação: 13/08/2015)
3. Dano Bumerangue: Quando há uma reação da vítima em detrimento da conduta lesiva do ofensor. A princípio, o prejuízo é causado pelo sujeito ativo, em virtude disso, o sujeito passivo (vítima) reage, abrindo a possibilidade de uma culpa concorrente, concausas ou ainda concorrência de causas. Pois a vítima concorre com sua conduta culposa para o resultado. Ação - reação. Quanto a indenização, Sérgio Cavalieri Filho aponta que: “(...) a doutrina e a jurisprudência recomendam dividir a indenização, não necessariamente pela metade, como querem alguns, mas proporcionalmente ao grau de culpabilidade de cada um dos envolvidos”;

[1] Alois (Aloys) Ritter von Brinz (Weiler-Simmerberg,25 de fevereiro de 1820Munique, 13 de setembro de 1887)

[2] No direito romano, em caso de inadimplemento/descumprimento de uma obrigação, a responsabilidade recaia sobre a pessoa, o devedor pagaria, na maioria das vezes, com sua própria vida. Com o advento do Lex Poetelia Papiria, o indivíduo passou a ser responsabilizado através de seus bens.
Referências

FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 10. Ed. São Paulo: Atlas, 2012.

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