segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018

MP no debate: O cumprimento de sentença da obrigação de alimentos

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O Código de Processo Civil entrou em vigor em 18 de março de 2016, mas ainda é salutar tecer algumas considerações sobre o cumprimento de sentença referente à obrigação de alimentos, que se fundamenta no princípio da solidariedade familiar, estando previsto no artigo 229 da Constituição Federal de 1988 que “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.
Inicialmente, é relevante anotar que os artigos 513 a 519 do Estatuto Processual disciplinam as disposições gerais que devem ser aplicadas nos incidentes de cumprimento de sentença ou de decisão, tais quais o modo de intimação do devedor, as espécies de títulos executivos judiciais e a competência do juízo, dentre outras.
Quanto à competência, restou estatuído pelo artigo 516, inciso II, do Código de Processo Civil que o cumprimento de obrigação de alimentos se dará no juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição ou no juízo do atual domicílio do credor (artigo 528, parágrafo 9º).
Especificamente, a execução da obrigação de alimentos, provisória ou definitiva, se dará, na forma do artigo 528, em fase de cumprimento de sentença quando se tratar de título judicial. Abrem-se aí duas possibilidades: a) seguimento pelo procedimento que autoriza a prisão civil; b) ou pelo procedimento mediante penhora de bens.
No primeiro caso, o prazo, após intimação do devedor, será de três dias para pagar ou provar a impossibilidade, sob pena de prisão de um a três meses, além de o juiz mandar protestar o pronunciamento judicial (parágrafos 1º e 3º do referido artigo). Restou normatizado o entendimento (da Súmula 309 do STJ) de que o débito alimentar que autoriza a prisão civil é o que compreende até as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que vencerem no curso do processo (parágrafo 7º do artigo 528).
Dispõe o artigo 531, parágrafo 1º que a execução dos alimentos provisórios, bem como a dos alimentos fixados em sentença ainda não transitada em julgado, se dará em autos apartados, ao passo que o cumprimento definitivo da obrigação de prestar alimentos será processado nos mesmos autos em que tenha sido proferida a sentença (parágrafo 2º). Todavia, o Tribunal de Justiça de São Paulo convencionou que, quer se trate de autos físicos, quer digitais, deverá a parte interessada ajuizar pedido apartado em meio eletrônico, com numeração própria, instruindo-o com as peças processuais necessárias, quais sejam, título executivo, demonstrativo do débito, documento das partes e procuração (Prov. CG 16/2016, Comunicado CG 438/2016 e Comunicado Conjunto CG 464/2016).
Exige-se a intimação pessoal do devedor, não se aplicando, portanto, as regras previstas nas disposições gerais que permitem a intimação na pessoa do advogado ou por meio eletrônico. Tal se deve em razão das graves implicações decorrentes do inadimplemento do devedor, que poderá ter sua prisão civil decretada. Em última hipótese, sua intimação poderá se dar por carta com aviso de recebimento no mesmo endereço dos autos.
Em se tratando de decisão proferida em sede de tutela de urgência, dispensável a intimação pessoal do devedor se este tiver procurador constituído nos autos, porquanto o processo onde fora instituída a obrigação ainda se acha em andamento.
Uma vez intimado, o devedor deverá justificar o inadimplemento mediante a comprovação de fato que tenha gerado a impossibilidade absoluta de pagar, caso contrário terá, como já visto, a prisão civil decretada pelo prazo de um a três meses. Não basta, portanto, a alegação genérica de que se acha sem condições de pagar o débito, sendo seu ônus a prova de fato inequívoco que o tenha impossibilitado.
Ainda em caso de descumprimento, poderá o pronunciamento judicial ser levado a protesto (artigo 528, parágrafo 1º), ou ainda o devedor poderá ter seu nome inscrito no cadastro de proteção ao crédito (artigo 782, parágrafos 3º e 5º). O cumprimento da pena imposta não eximirá o devedor, por óbvio, do pagamento das prestações alimentícias vencidas e vincendas (artigo 528, parágrafo 5º).
Na hipótese "b" antes referida, em se tratando de débito superior a três prestações, não será admissível a prisão civil (artigo 528, parágrafo 8º), devendo a execução se dar na forma do artigo 523 (obrigação de pagar quantia certa), fazendo-se a intimação do executado para pagar o débito em 15 dias, acrescido de multa e honorários de 10% se não ocorrer o pagamento voluntário, sob pena de penhora de bens (parágrafo 3º).
De outro modo, ajuizado o cumprimento de sentença sob o rito da prisão civil, não incidirá o acréscimo da multa prevista no artigo 523, porquanto descabida dupla sanção. Nada impede, contudo, que no decorrer do processo o credor requeira, caso não ocorra o cumprimento da obrigação, a conversão do rito para o procedimento de penhora de bens (artigo 530).
Não se tem admitido o seguimento da execução mediante a cumulação simultânea desses dois procedimentos em único processo, ou seja, sob pena de prisão civil e também penhora de bens, por incompatibilidade de ritos (Agravo de Instrumento 2026620-59.2016.8.26.0000, TJ-SP). Assim, caso o débito alimentar seja superior a três parcelas, caberá ao credor optar por um ou outro procedimento ou, em última hipótese, poderá ingressar com dois pedidos autônomos de cumprimento de sentença, cada qual sob o procedimento adequado, em dois processos distintos, sem necessidade de apensamento, mas perante o mesmo juízo. Também já se decidiu que a opção pelo rito adotado é do credor (Agravo de Instrumento 2190996-28.2017.8.26.0000, TJ-SP).
Tendo o credor optado pelo rito da penhora de bens (artigo 528, parágrafo 8º c.c. artigo 523), e decorrido o prazo para cumprimento pelo devedor, a multa incidirá sobre a totalidade do débito. Caso tenha ocorrido o pagamento parcial, a multa e os honorários incidirão sobre o restante (artigo 523, parágrafo 2º). Em seguida, será expedido mandado de penhora e avaliação, que poderá ter seu cumprimento mediante bloqueio on-line da conta bancária do devedor.
Independentemente de penhora, uma vez transcorrido o prazo de 15 dias sem o pagamento voluntário, inicia-se automaticamente novo prazo de 15 dias para o devedor apresentar nos autos sua impugnação, onde poderá alegar exclusivamente as matérias elencadas no artigo 525, parágrafo 1º, tais como falta ou nulidade de citação no processo de conhecimento, ilegitimidade, inexigibilidade da obrigação ou inexequibilidade do título, penhora ou avaliação incorreta, excesso de execução, incompetência ou qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação.
Caso alegue excesso de execução, o devedor deverá apresentar o valor que entende adequado acompanhado do respectivo demonstrativo de cálculo, sob pena de não conhecimento da alegação (artigo 525, parágrafo 5º). É importante observar que a impugnação do devedor poderá ser apresentada sem prévia garantia do juízo (Agravo de Instrumento 2061048-67.2016.8.26.0000, TJ-SP).
Presentes os requisitos legais, o juiz poderá, após a impugnação, conceder-lhe efeito suspensivo (artigo 525, parágrafo 6º), sem prejuízo dos atos de substituição, reforço, redução da penhora ou avaliação dos bens.
O devedor poderá, antes de ser intimado para o cumprimento da sentença, comparecer em juízo e oferecer em pagamento o valor que entender devido (artigo 526), podendo o credor impugnar o valor depositado. Se constatada a insuficiência do valor, o juiz determinará o prosseguimento da execução com penhora e atos subsequentes. Ou declarará satisfeita a obrigação caso o credor não se opuser ao valor depositado.
Restou também disciplinado que, sem prejuízo dos alimentos vincendos, poderá o juiz mandar descontar das rendas do devedor, de forma parcelada, o débito apurado, desde que, somado à prestação mensal devida, não ultrapasse 50% de seus ganhos líquidos (parágrafo 3º do artigo 529). Outrossim, o parcelamento do débito depende da concordância do credor, pois constitui faculdade deste (Agravo de Instrumento 2075135- 91.2017.8.26.0000, TJ-SP).
Por outro lado, a execução dos alimentos fundada em título extrajudicial (artigo 911) está inserida no Título II, do Livro II, referente às diversas espécies de execuções. Por não haver sentença ou decisão judicial que a instituiu, a obrigação será exigida em procedimento específico de execução de título extrajudicial. O executado, desta feita, será citado, e não meramente intimado, para em três dias efetuar o pagamento das parcelas anteriores e das que se vencerem no curso da ação, podendo provar que o fez ou justificar a impossibilidade de fazê-lo, aplicando-se, no que couber, o disposto nos parágrafos 2º a 7º do artigo 528, ou seja, a execução poderá ser promovida sob pena de prisão civil.
Também será possível que a execução se dê na forma do artigo 824 e seguintes (execução por quantia certa mediante a expropriação de bens do executado). Nessa hipótese, a defesa do devedor poderá se dar mediante apresentação de embargos à execução (artigo 914), constituindo título executivo extrajudicial o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública e pela Advocacia Pública (artigo 784, IV), dentre outros.

Portanto, constata-se que o atual estatuto processual civil inovou e trouxe diversos instrumentos visando à concretização da obrigação alimentar, constitucionalmente imposta no artigo 229 da Constituição Republicana de 1988, o que concretiza os princípios básicos dos deveres inerentes ao poder familiar e ao princípio da solidariedade.
Rogério Alvarez de Oliveira é promotor de Justiça e integrante do Movimento do Ministério Público Democrático.
Revista Consultor Jurídico, 12 de fevereiro de 2018, 8h00
https://www.conjur.com.br/2018-fev-12/mp-debate-cumprimento-sentenca-obrigacao-alimentos

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