quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Tutela antecipada: prova inequívoca e verossimilhança

O primeiro conceito a ser buscado, assim, é o de prova inequívoca, afinal, é dela que surge a verossimilhança, devendo, ambas, sempre estarem presentes, em qualquer hipótese de antecipação da tutela.

Quanto ao conceito prova não deve haver maiores digressões, afinal, está ele presente no dia a dia dos profissionais do direito desde os primeiros anos da vida acadêmica, sendo um dos primeiros a serem enfrentados quando se estuda processo civil. De forma simples e rápida, porém, a prova pode ser definida como sendo os elementos de convicção, presentes nos autos do processo.

Sem dúvida que o problema maior reside na definição do que vem a ser a prova dita inequívoca.

A princípio poder-se-ia acreditar que prova inequívoca é a absoluta, incontestável e que não deixa nenhuma margem a que o requerido se oponha aos fatos narrados pelo autor. Contudo, não é assim.

Cassio Scarpinella Bueno, discorrendo acerca do assunto, escreve que:
O melhor entendimento para "prova inequívoca" é aquele que afirma tratar-se de prova robusta, contundente, que dê, por si só, a maior margem de segurança possível para o magistrado sobre a existência ou inexistência de um fato. (2007: p. 37).
Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira, definem prova inequívoca de forma bastante similar:
Prova inequívoca não é aquela que conduza a uma verdade plena, absoluta, real – ideal inatingível tal como já visto no capítulo relativo à Teoria Geral da Prova -, tampouco a que conduz à melhor verdade possível (a mais próxima da realidade) – o que só é viável após uma cognição exauriente. Trata-se de prova robusta, consistente, que conduza o magistrado a um juízo de probabilidade, o que é perfeitamente viável no contexto da cognição sumária. (2008: p.624).
Colhe-se da doutrina, portanto, e tal lição encontra respaldo nos valores norteadores do processo civil atual, que a prova inequívoca mencionada pelo Código não é a prova absoluta, mas, também, não é a prova por demais tênue e que não traga aos autos um mínimo grau de segurança de que os fatos narrados são verdadeiros.

A prova inequívoca deve ser prova forte, contundente e que convença de que os fatos que fundam a pretensão do postulante têm elevadas chances de serem verdadeiros e virem a se confirmar, durante a instrução processual.

Prova inequívoca, repita-se, é aquela que, prima facie, inclina o magistrado ao convencimento de que os fatos narrados pelo autor ocorreram da forma por ele indicada, conduzindo, portanto, a um juízo de que sua pretensão, provavelmente, será acolhida ao final:
... É a prova inequívoca que conduz o magistrado a um estado de verossimilhança da alegação. Verossimilhança no sentido de que aquilo que foi narrado e provado parece ser verdadeiro. Não que o seja, e nem precisa; mas tem aparência de verdadeiro. É demonstrar ao juízo que, ao que tudo indica, mormente à luz daquelas provas que são apresentadas (sejam documentais ou não), o fato jurídico conduz à solução e aos efeitos que o autor pretende alcançar na sua investida jurisdicional. (Bueno, 2007: p. 38).
Não se exige, assim, prova absoluta dos fatos, mas, apenas, provas, evidências que apontem na direção da veracidade destes fatos. Atento a esta circunstância, Marinoni escreve que: "... Exigir uma evidência que torne impossível a antecipação da tutela é uma opção distante da realidade da justiça civil; uma opção cômoda, mas não séria" (2009: p. 164).

A inequivocidade que se exige da prova, por fim, deve ser temperada pelos valores em discussão no processo. Sem dúvida, não raras vezes os valores pretendidos e defendidos por autor e réu são diversos, e recebem, inclusive, diferenciada proteção jurídica.

Para ilustrar a situação, interessante a menção a um exemplo presente na rotina forense. O autor que vem a juízo postulando seja o Estado compelido ao fornecimento de um medicamento batalha pela preservação do valor "vida", que merece a mais completa e atenciosa proteção do ordenamento jurídico, inclusive da Constituição Federal, em seu artigo 5º. Já o Estado, que se opõe à pretensão do autor, defende seu equilíbrio fiscal. Por certo que, entre a vida e o equilíbrio fiscal, o primeiro valor deve ser destacado, protegido e realizado com prioridade inafastável.

E, por óbvio que, havendo conflito entre valores diferenciados, também diferenciado deve ser o critério para que a prova seja considerada inequívoca:
Assim, nas situações em que o direito material justifica a redução da exigência da convicção no final do processo e naquelas em que o direito material e o caso concreto apontam para a dificuldade de se produzir prova quando da tutela antecipatória, não há como deixar de elaborar critérios que possam auxiliar o encontro de um tratamento justo. (Marinoni, 2009: p. 186).
Conclui-se, assim, que prova inequívoca é aquela que conduz o magistrado à impressão, impressão séria, insista-se, e não mera intuição desfundamentada, de que os fatos narrados pelo autor são verdadeiros e dão fundamento sólido à sua pretensão, tornando-a verossímil, ou seja, sinalizando que o direito vigente a acolhe. Segundo a doutrina de Cássio Scarpinella:
É a prova que é inequívoca (prova contundente, prova bastante, prova forte, prova muito convincente por si só, independentemente da apresentação de outras), e, como toda e qualquer prova (e a teoria da prova não se prende, apenas e exclusivamente, à tutela antecipada), ela nada mais é do que um meio para convencer o magistrado de alguma coisa. (2007: p. 38/39).
Mais adiante o mesmo Cassio Scarpinella finaliza o raciocínio:
Por essa razão, aliás, é que me parece importante sempre entender, compreender, interpretar e aplicar as duas expressões em conjunto; é a prova inequívoca que conduz o magistrado à verossimilhança da alegação. (2007: p. 39).
A verossimilhança necessária para a antecipação da tutela, assim, não brota da mera argumentação jurídica de seu pretendente. Muito mais do que desenvolver uma tese jurídica bem fundamentada, do ponto de vista teórico, o autor deve concatenar esta mesma tese aos fatos dos quais trouxe a prova inequívoca aos autos:
Esse pressuposto é indicativo de que não basta ao requerente da tutela antecipada formular, retoricamente, seu pedido. A lei é clara quanto à necessidade de serem apresentadas provas, substratos materiais, do quanto alegado. Não basta falar (escrever); tem de demonstrar, mesmo que a prova não seja documental. (Bueno, 2007: p. 39).
A verossimilhança nasce de um juízo crítico positivo dos fundamentos jurídicos da pretensão posta, ou seja, das alegações "de direito". Didier Jr., Braga e Oliveira escrevem que:
É imprescindível acrescentar que a verossimilhança refere-se não só à matéria de fato, como também à plausibilidade da subsunção dos fatos à norma invocada, conduzindo aos efeitos pretendidos. O magistrado precisa avaliar se há probabilidade de ter acontecido o que foi narrado e quais as chances de êxito do demandante. (2008: p. 627).
O raciocínio jurídico apresentado, contudo, deve, necessariamente, estar calcado em fatos comprovados inequivocamente, isto é, com o necessário grau de certeza, conforme prudente apreciação dos valores postos em juízo. Segundo a doutrina:
Trata-se, enfim, de um pressuposto objetivo de concessão da tutela antecipada: o magistrado deverá demonstrar que há nos autos prova produzida, com tais características, que justifique a conclusão pela verossimilhança das alegações. Significa dizer, ainda, que a mera alegação do demandante, não acompanhada de prova, não permite a concessão da medida, por mais verossímil que seja. (Didier Jr., Braga e Oliveira, 2008: p. 626).
Parâmetro bastante razoável para a averiguação da presença da verossimilhança pode colhido do Curso de Marinoni e Arenhart, que escrevem que:
A verossimilhança a ser exigida pelo juiz, contudo, deve considerar: (i) o valor do bem jurídico ameaçado, (ii) a dificuldade de o autor provar sua alegação, (iii) a credibilidade da alegação, de acordo com as regras de experiência, e (iv) a própria urgência descrita. (2010: p.213).
A verossimilhança do direito do postulante da tutela antecipada, assim, está calcada na prova inequívoca, anda próxima dela, mas com ela não se confunde.
_____________________________________________________________________________
FERREIRA, Rodrigo Emiliano. Tutela antecipada: linhas gerais e requisitos para sua concessão . Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3080, 7 dez. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20599>.

4 comentários:

  1. Muito bom o seu Blog. Vou acompanhá-lo.

    ResponderExcluir
  2. Parabéns Prof. Patricia,
    o seu blog é excelente!

    Fernando HP

    ResponderExcluir
  3. Muito oportuno o conhecimento Juridico!

    ResponderExcluir
  4. Excelente. Esclareceu-me bastante sobre o assunto em tela. Já adicionei o blog em meus favoritos, pois entendo ser de suma importância o acompanhamento das matérias aqui publicadas. Parabéns Professora Patrícia!

    ResponderExcluir