Depois de uma disposição geral acerca da filiação, tendo por conta seu
desenvolvimento histórico e de concepção ao Direito
Civil-Constitucional, necessária se faz a tratativa conceitual de seu
moderno instituto.
Silvio Rodrigues[64] coloca a filiação como
sendo “a relação de parentesco consanguíneo, em primeiro grau e em linha
reta, que liga uma pessoa àquelas que a geraram, ou a receberam como se
tivesse gerado”. Esta assertiva, bem a rigor, correlacionada com o
disposto por outros autores, no que tange à expressão de necessidade de
consanguinidade para estabelecimento do estado filiativo, é um tanto
quanto equivocada, vez que restringe o estabelecimento doutras espécies,
tal como veremos por oportuno.
Maria Berenice Dias[65] cita a importância de
que, após o nascimento de determinado indivíduo, este se coloque na
posição de determinada família, vez que se torna impossível a
sobrevivência do ser humano, por princípio, autonomamente. Por um longo
período de tempo, este deverá ser guiado por pessoas capazes de lhe dar
afeto e base estrutural para o pleno desenvolvimento de suas capacidades
intelectuais e metafísicas.
A nova metodologia jurídica adotada com a Constituinte de 1988 abarcou o
sentido de proteção do indivíduo, trazendo-o para a concepção de formar
um sujeito de direito. É neste sentido que Maria Berenice Dias[66] coloca a família, reafirmando a conotação social da lei, concluindo que:
Todas essas mudanças refletem-se na identificação dos vínculos de parentalidade, levando ao surgimento de novos conceitos e de uma nova linguagem
que melhor retrata a realidade atual: a filiação social, filiação
socioafetiva, estado de filho afetivo etc. Ditas expressões nada mais
significam que a consagração, também no campo da parentalidade, do novo
elemento estruturante do direito das famílias. Tal como aconteceu com a
entidade familiar, a filiação começou a ser identificada pela presença
do vínculo afetivo paterno-filial
É com esta premissa adotada, que Paulo Lôbo aduz, conceitualmente, a
noção de filho, dando encaixe em situações outras que não a restringem.
Filiação é o conceito relacional; é a relação de parentesco que se
estabelece entre duas pessoas, uma das quais nascida da outra, ou
adotada, ou vinculada mediante a posse de estado de filiação ou por
concepção derivada de inseminação artificial heteróloga. Quando a
relação é considerada em face do pai, chama-se paternidade, quando em
face da mãe, maternidade. Filiação procede do latim filiatio, que
significa procedência, laço de parentesco dos filhos com os pais,
dependência, enlace.[67]
Nesta mesma seara interpretativa é que Maria Helena Diniz[68]se
coaduna. Assim como Paulo Lôbo, a douta jurista confirma a presença
doutras espécies de filiação, e cientifica a proteção jurídica, mediante
disposição constitucional, ainda que intrínseca, da espécie
socioafetiva.
Importante salientar que, por conseguinte, trataremos, em capítulo
específico, da filiação socioafetiva, tema central deste trabalho
monográfico. A citação desta espécie de filiação se faz imperiosa ao
tempo, vez que a noção de filiação, com a nova constituinte, reiterando a
já explicitada desvinculação do texto constitucional civil para com as
regras do Direito Canônico, fez com que a origem do filho seja
irrelevante para o Direito, bastando, para a compatibilização da relação
jurídica entre o intitulado pai (lato senso) e o instituído filho, a
relação prática e convivencial deste para com aquele.
Há a coadunação do explicitado às palavras de Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald[69].
Assim, sob o ponto de vista técnico-jurídico, a filiação é a relação de
parentesco estabelecida entre pessoas que estão no primeiro grau, em
linha reta entre uma pessoa e aqueles que a geraram ou que a acolheram e
criaram, com base no afeto e na solidariedade, almejando o
desenvolvimento da personalidade e a realização pessoal. Remete-se,
pois, ao conteúdo do vínculo jurídico entre as pessoas envolvidas
(pai/mãe e filho), trazendo a reboque atribuições e deveres variados.
Se torna evidente e necessária a aplicação do disposto quando do
consagrado princípio da igualdade entre os filhos, independente de sua
origem de parentalidade, conforme colocação do artigo 1.596 do Código
Civil Pátrio, reiterando a regra do artigo 227, §6º da Constituição da
República Federativa do Brasil.
Conforme preconiza Maria Helena Diniz[70], a
classificação de filhos pode ser feita somente como consequência de sua
didática sem que, para tanto, isto signifique uma diferenciação de
tratamento. Desta maneira, serão tratados os filhos tidos matrimoniais e
não matrimoniais, por conseguinte e, consequentemente, aqueles havidos
por adoção, cada um em seu específico tópico.
BARCELOS, Daniel Gilson.
A formação do estado filiativo na socioafetividade e o direito sucessório por sua decorrência
. Jus Navigandi, Teresina,
ano 18,
n. 3498,
28jan.2013
.
Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23563>. Acesso em: 1 fev. 2013.
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