A lei 8213/91, criada em mau momento, manda contratar deficientes,
estabelecendo enorme percentual incidindo sobre o número de empregados
mantidos pelas empresas, percentual dificílimo de ser atendido por
várias razões. O não preenchimento das quotas gera punições. Ressalte-se
que as autoridades não informam, com eficiência, onde os deficientes
podem ser encontrados, no escopo de admiti-los, argumentando que o
problema é das empresas. Não se pode controlar qualquer um, porque os
riscos do negócio são da empresa, conforme art. 2º/CLT, de modo que
qualquer deslize praticado pelo deficiente implicará em obrigação de a
empresa indenizar a vitima ou familiares, conforme artigos 5º, X/CF/88,
186, 944, 927/CCB. O pedido de indenização pelos danos morais virou
modismo no pretório trabalhista, com a concessão de vultosos valores,
todos fora dos princípios da razoabilidade e do bom senso.
A contratação de deficientes tem sido tarefa muito difícil pelas
empresas, por vários motivos. Em primeiro lugar, inexistem empresas
fornecedoras de deficientes. Os anúncios nos jornais não surtem efeitos.
O mesmo ocorre quando as empresas, através de circulares internas,
pedem aos empregados para encaminhar deficientes e lhes dar ciência da
existência dos empregos. Há casos – e muitos – que as empresas
necessitam de mão de obra qualificada, a qual inexiste. Um hospital, por
exemplo, não pode contratar deficiente visual para trabalhar no CTI,
UTI e enfermaria. Uma empresa de transporte não pode contratar motorista
sem braços, pernas, cego ou surdo. E assim vai em todas as áreas. Um
enfermeiro sem braços não pode trabalhar na enfermaria do hospital,
porque, se colaborar para a morte do paciente, o hospital terá que
indenizar a família do falecido, com base nos artigos 5º, X/Constituição
Federal, 186 e 927/Código Civil de 2002, mesmo se tiver feito o
contrato de seguro. Dita indenização constitui modismo na Justiça do
Trabalho, com condenações elevadas, porque não há critérios objetivos
para a sua fixação, de modo que cada Juiz, a seu modo, arbitra valores
incomensuráveis.
Os Auditores do MTE e os Procuradores do Trabalho, ávidos pela
assinatura de leoninos Termos de Ajustamento de Conduta e para encher,
mais ainda, os cofres do FAT, reduto do PDT no Ministério do Trabalho,
enxergam a seu modo a lei 8213/91, sendo que os Procuradores ajuízam, na
Justiça do Trabalho, as nefandas Ações Civis Públicas, fazendo letra
morta do princípio da razoabilidade e do bom senso.
Pela Lei 8213/91, as empresas, contando mais de 100 empregados, são
obrigados a destinar de 2% a 5% de suas vagas para deficientes. Chegam a
pedir a despedida de empregados sadios para o preenchimentos das vagas
com deficientes, gerando o terrível caos social e notória discriminação!
A Justiça do Trabalho, contando com alguns Juízes bons, tem cancelado
as arbitrárias multas impostas pelos Auditores do Trabalho, os quais
asseveram que a contratação constitui problema e obrigação das empresas,
em odioso entendimento da lei 8213/91, esquecidos da função social das
empresas: dão empregos, pagam elevados tributos e taxas, colaboram para
extirpar a crise social e quejandos. Há o crescimento econômico do país.
Na interpretação da lei, que é de 1991, o Juiz, deve respeitar o
princípio da razoabilidade, porque existem as vagas, mas inexistem
profissionais qualificados para seu preenchimento, com notória escassez
no mercado de trabalho. Assim, obrigar as empresas a contratar qualquer
um, uma pessoa despreparada, é o mesmo que colocar, às escâncaras, em
risco o empreendimento. O empenho em contratar os portadores de
necessidades tem sido só das empresas, havendo inércia dos Poderes,
mormente do Executivo, via MTE e Procuradoria do Trabalho, que não
colaboram em nada. Pelo contrário, querem metas para o FAT, enchendo
seus cofres e cujo destino, como a mídia divulga, não é dos melhores.
A construção civil e vigilância, por exemplo não conseguem deficientes
qualificados. Nos Tribunais de Brasília, Rio e São Paulo, as empresas
têm logrado sucesso, porque para eles não se pode interpretar a lei
8213/91 de forma isolada e literal. Adite-se que, segundo o próprio MTE,
na Instrução Normativa 20/2001, esses profissionais teriam de ser
reabilitados pela Previdência Social ou terem características
comprovadas para uma determinada atividade na empresa.
Por falta de deficientes habilitados, como é público e notório, as
empresas têm sido penalizadas injustamente. A Ministra Cristina Peduzzi,
do TST, em certo julgamento, prelecionou que é impossível o portador de
deficiência física participar de cursos de formação de vigilantes e,
dependendo do tipo de deficiência, possa exercer a função. Infelizmente,
os Auditores e Procuradores do Trabalho, fazendo literal interpretação
da lei, em nada oferecem de útil, porque só visam aplicar multas em prol
do FAT, fugindo, infelizmente, da razoabilidade e do bom senso.
Felizmente, há Juízes do Trabalho, dotados de saber jurídico, bom
conhecimento de hermenêutica e sabedoria, anulam as violentas multas e
julgam improcedentes as ações civis públicas. Sugiro que eles, ávidos
pela permanente punição às empresas, incentivem a criação de empresas
fornecedoras de mão de obra composta de deficientes, valendo-se de todos
os meios de ampla publicidade, porque o impossível não se cumpre.
O Desembargador André R. P. V. Damasceno, do TRT de Brasília, no processo 00437-2007-018.10.00.1, assim decidiu:
“Empresas de vigilância privada. Vagas destinadas a deficientes físicos. Artigo 93, da Lei 8213/91. Cálculo do percentual. Incidência sobre o efetivo das empresas, excluídos os empregos de vigilância. A empresa que contar com 100 ou mais trabalhadores deverá obedecer a um percentual de empregados portadores de necessidades especiais, segundo estabelece o caput do art. 93 da lei 8213/91. Contudo, tal dispositivo de lei deve ser interpretado levando-se em consideração as peculiaridades materializadas no caso concreto. As empresas de vigilância privada são regidas pela lei 7102/83 que traz normas especificas para o exercício da profissão de vigilante, sendo obrigatória a aprovação em curso de formação de vigilante, envolvendo matérias relativas à defesa pessoal, armamento e tiro, entre outras, além de aprovação de exames de saúde física, mental e psicotécnico. É de se notar que as habilidades exigidas no curso de qualificação para vigilantes revelam-se incompatíveis com as restrições de uma pessoa portadora de necessidades especiais, defendo o cálculo de percentual a que alude o referido dispositivo de lei incidir sobre o efetivo das empresas de vigilância excluídos os empregos de vigilante”.
O auto de infração foi anulado pelo TRT, em correta interpretação da
lei. A possibilidade de se mitigar o alcance da legislação que promove a
inserção dos portadores de deficiência no mercado de trabalho está
expressa, inclusive no Decreto 3298/99, que regulamenta a lei 7853,
24/10/89 e dispõe sobre a politica nacional para integração da pessoa
deficiente, cujo artigo é taxativo, estabelecendo que não se aplica o
disposto no artigo anterior nos casos de admissão que exija aptidão
plena do candidato.
O Desembargador Braz Henriques de Oliveira, relator do processo 00440-2009-005.10.00.0, do TRT de Brasília, assim prelecionou:
“Artigo 93 da lei 8213/91. Auto de infração. Multa. Nulidade. É certo que as empresas devem atender ao preceito constitucional regulamentado pelo artigo 93 da lei 8213/91, que visa a adaptação social do portador de deficiência. Todavia, no caso concreto, não pode a empresa ser punida pela dificuldade de se encontrar mão-de-obra com o perfil previsto na norma legal, reabilitadas ou portadoras de deficiência, que atendam os requisitos necessários para assumir os cargos colocados à disposição”.
A multa foi anulada, bem como o auto de infração. Constou no acórdão
que a empresa não é a única que tem tido dificuldades para cumprir
integralmente o comando legal, visto que a lei 8213/91 se dirige aos
beneficiários da previdência social, reabilitados ou pessoa portadora de
deficiência habilitada e estas são raras a se apresentar.
Mas não é só.
Sabidamente o artigo 93 é inconstitucional, porque discrimina os
candidatos sadios aos empregos. Ressalto que o Censo do IBGE de 2010
apurou que 23,9% da população tinha pelo menos um dos tipos de
deficiência investigados (visual, auditiva, motora e mental).
O grande Cícero prelecionou que: “Direito é a arte do bom senso”,
verdade incontestável. A experiência de vida, razoabilidade, bom senso e
sensibilidade jurídica dos Juízes resolvem eterna e rapidamente os
pedidos de anulação dos autos de infração impostos pelos Auditores,
violadores da Lei de Abusos de Autoridade (Lei 4898/65). O bom Juiz não
pensa que é capaz, porque sabe é mesmo capaz na mais elevada acepção
para corrigir os abusos de autoridades.
A seguir consta uma bela sentença de Juiz culto e de bom senso.
O Juiz José Mateus Alexandre Romano, da 38ª Vara do Trabalho do Rio de
Janeiro no processo 0025800-83-2008-501.0038, bem fundamentou sua
sentença, ensinando: no entanto, o certo é que há provas nos autos que,
de várias formas, mesmo através de concursos a empresa tentou
repetidamente preencher a cota prevista no art. 93 da lei 8213/91. Disse
que a interpretação da norma é teleológica e dentro do princípio da
razoabilidade, não entanto a empresa obrigada a contratar pessoas
despreparadas, sem noção técnica para o cargo que irá ocupar, sem as
habilidades necessárias para o cargo. A colocação daqueles que não são
portadores de deficiência está difícil, apesar dos noticiários em
jornais demonstrar a existência de vagas. As vagas existem mas o que não
está existindo é a qualificação dos candidatos a emprego. Obrigar
empresas a contratar qualquer um, um despreparado, sem qualificação
profissional, é o mesmo que colocar em risco o empreendimento. A empresa
não pode ser apenada por não ter conseguido atingia a cota, porque a
percentagem do art. 93 da lei 8213/91 tem que ser interpretada dentro do
princípio da razoabilidade. Contrato é a manifestação bilateral de
vontades. Não tem a empresa, por outro lado, o poder de obrigar o
candidato ao emprego a aceitar a remuneração oferecida, as condições de
trabalho previstas em norma regulamentar. Normalmente as empresas não
conseguem cumprir a cota por motivos alheios à sua vontade. O princípio
da razoabilidade não pode ser esquecido pelo Julgador. Basta a empresa
tomar alguma providência para contratar o deficiente para ficar inume à
pesada multa em favor do FAT que, na realidade, nunca se reverterá para
os deficientes.
O princípio da solidariedade previsto nos artigos 208 e 227§1º/CR
revela não ser plausível que o Estado se omita em tão importante questão
que é a adaptação social integral do portador de deficiência, esperando
que as empresas supram as falhas das famílias, das escolas e da
previdência social. Ressalte-se que a Juíza do Trabalho Patrícia Tostes
Poli, da 21ª Vara do Trabalho de Curitiba, julgando o processo nº.
34173-2009-041.09.00.4, anulou um auto de infração lavrado por auditor
fiscal federal, desconstituindo-se o débito tributário dele decorrente e
deu uma verdadeira aula sobre o tema sempre ressaltando que o princípio
da razoabilidade nunca pode ser ignorado por nenhuma autoridade.
O Executivo nada faz para preparar os deficientes para o mercado de
trabalho, deixando-os a própria sorte. Seria interessante a criação pelo
Executivo de um Órgão preparatório, visando acabar com a carência de
portadores de deficientes habilitados. Saliento que a capacitação
profissional é degrau obrigatório do processo de inserção do deficiente
no mercado de trabalho. A Secretaria de Inspeção do Trabalho, através da
Instrução Normativa 20/2001, orientou os auditores fiscais do trabalho
na fiscalização do cumprimento do artigo 93 da 8213/91, definiu como
pessoa portadora de deficiência habilitada, aquelas que não se
submeteram a processo de habilitação, incluindo como habilitadas as
capacitadas para o trabalho, indo além da vontade da lei e reconhecendo,
implicitamente, a carência de portadores de deficiência habilitados.
Relembro, ao ensejo, para reflexão, as palavras de J. Bernstein, citado por Winston Churchiel 1940:
“Se todos soubessem como são feitas as leis e as salsichas, ninguém seguiria umas nem comeria as outras”.
O aforisma é bem pertinente aos tempos hodiernos, ressaltando-se que
nem tudo que vem de Brasília é bom. Há leis que são como vacinas: umas
pegam, outras não. A lei 8213/91 é exemplo típico, porque, na prática e à
mingua de deficientes capacitados, ela não vingou, embora sancionada há
11 anos, repetindo que não tem a mínima condição de ser aplicada, pelas
fortes razões aqui trazidas e outras de pessoas sérias e estudiosas.
O TRT/2ª Região, em recente decisão julgou o processo
05224001320065020081, relatora a Ilustre Desembargadora Ana Cristina
Lobo Petinati, concluindo pela improcedência da ação civil pública
movida pelo MPT, onde destacou a boa fé da empresa, que tudo vez para
conseguir a mencionada mão de obra. Publicou os anúncios de emprego a
candidatos portadores de deficiência, revelando que a empresa também tem
por escopo o atendimento de sua função social no mercado produtivo coma
inclusão de pessoas portadoras de deficiência, quando habilitadas a
exercer o cargo disponível. Também implantou um programa de qualificação
de pessoa com deficiência, tendo assinalado que tal conduta não fora
suficiente com o SENAI. A empresa se esforçou em habilitar empregados
para o cumprimento das tarefas que por estes podem ser desempenhadas. É
inequívoca a dificuldade de contratação de portadores de deficiência
compatíveis com as funções a serem exercidas. Na sentença ficou
destacada a confissão do MPT quanto à dificuldade da empresa em
encontrar profissionais habilitados para o preenchimento das vagas,
sendo inequívoca a dificuldade de cumprir a lei em face da precariedade e
carência de profissionais pertencentes ao universo dos reabilitados
pela previdência social ou portadores de deficiência. Importa sinalizar
que o artigo 93 da lei 8213/91 não aponta como destinatário da norma o
portador de deficiência sem nenhuma qualificação, mas, antes, os
habilitados e reabilitados não havendo como concluir que para estes
devam as empresa abrir sua portas pelo simples fato de serem
deficientes, desempregados, desativados do mercado de trabalha,
resumidas como condição “SINE QUA NOM”, para que as empresas estejam
obrigadas a admiti-los sem o preenchimento do requisito habilitação para
tanto. O Julgador na aplicação ao caso concreto deve observar o esforço
da empresa para a contratação. Para corroborar meu entendimento, cito
ainda as decisões proferidas nos julgamentos do TST nos AIRR
134200-63-2007-5.02.0083, julgado em 07/11/2012 e publicado no dia
09/11/2012 e AIRR 196400-23-2008-5.20.0002, julgado em 26/09/2012 e
publicado em 28/09/2012. Verifico, com alegria, que o Colendo TST tem
adotado o meu entendimento.
Não é justo que os empregadores assumam ônus exclusivos do Poder
Executivo, sendo punidos com injustas e pesadas multas destinadas ao
FAT, integrante do Ministério do Trabalho, repetindo-se que estas multas
não se revertem para os deficientes, como é público e notório.
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