O Envidraçamento das Sacadas em Condomínios Edilícios
A primeira questão que surge quando o tema envidraçamento das sacadas
em condomínio edilício é abordado é se há permissão legal para tal, bem
como o posicionamento da jurisprudência sobre o tema. De fato uma
questão de difícil resposta haja vista, em primeira análise a alteração
de fachada, segundo a legislação vigente, ser totalmente vedada. Não
Obstante, não há como negar que a pratica do envidraçamento das sacadas
em condomínios edilícios é uma realidade; estariam todos infringindo a
legislação?
O condomínio edilício ou condomínio em plano horizontal é atualmente
regido pelo código civil, Lei 10.406 de 10 de Janeiro de 2002, em seus
artigos 1331 a 1358, e pela a Lei 4591/64, no que couber, haja vista,
conforme entendemos, a revogação tácita de alguns de seus artigos pelo
Novo Código Civil.
O Envidraçamento das Sacadas e a Legislação
O artigo 1.336 do CC dispõe sobre os deveres dos condôminos; dentre
estes destacamos o de não realizar obras que comprometam a segurança da
edificação, previsto no inciso II do referido artigo e o de não alterar a
forma e a cor da fachada, das partes e esquadrias externas, disposto
inciso III do mesmo.
Além dos deveres previstos no artigo 1.336, estão os condôminos também
sujeitos às regras do direito de vizinhanças, estas previstas nos
artigos 1.277 a 1.313 do Código Civil.
Dentre o direito de vizinhança, destacamos os artigos 1277, 1.306, 1.308 e 1.312 do CC, reproduzidos a seguir in verbis:
Art. 1.277. O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.
À luz do artigo 1277, admitida a possibilidade de envidraçamento das
sacadas em condomínios edilícios, qualquer condômino poderia, a qualquer
tempo, exercer o direito de cessar as interferências à sua segurança e a
dos que habitam o condomínio, desta forma, podendo exigir a cessação ou
desfazimento da obra de envidraçamento de sacadas se esta trouxer
qualquer perigo aos que lá habitam; vide também o artigo 1312 infra,
seja pela possibilidade do desprendimento dos vidros ou comprometimento
da estrutura da edificação, tais como vigas, colunas, pisos de concreto
armado, notadamente o piso da sacada, parapeito da sacada em que se
apoiará a obra de envidraçamento e assim por diante.
Art. 1.306. O condômino da parede-meia pode utilizá-la até ao meio da espessura, não pondo em risco a segurança ou a separação dos dois prédios, e avisando previamente o outro condômino das obras que ali tenciona fazer; não pode sem consentimento do outro, fazer, na parede-meia, armários, ou obras semelhantes, correspondendo a outras, da mesma natureza, já feitas do lado oposto.
Em relação ao artigo 1306, o condômino que pretendesse realizar obra de
envidraçamento de sacada, na hipótese de ser permitida, teria a
obrigação de obter autorização do vizinho de parede-meia, caso houvesse a
necessidade de utilizá-la para suporte das esquadrias, ou qualquer
outro equipamento de sustentação da obra de envidraçamento, não o
fazendo, poderia o vizinho de parede-meia invocar o artigo 1277 supra e
1312 infra e exigir a cessação ou desfazimento da obra.
Art. 1.308. Não é lícito encostar à parede divisória chaminés, fogões, fornos ou quaisquer aparelhos ou depósitos suscetíveis de produzir infiltrações ou interferências prejudiciais ao vizinho.
Se além do envidraçamento das sacadas, tivesse o condômino o interesse
em instalar churrasqueiras e seus acessórios, tal pretensão encontraria
óbice no artigo 1308, pois, expressamente proibido em lei, sendo,
portanto, objeto de desfazimento ou cessação da obra por exigência do
vizinho de parede-meia, ou mesmo, segundo nosso entendimento, de
qualquer condômino do edifício, bastando para isto invocar o artigo 1277
supra e o 1312 infra.
Art. 1.312. Todo aquele que violar as proibições estabelecidas nesta Seção[1] é obrigado a demolir as construções feitas, respondendo por perdas e danos.
Importante observar que, de acordo com inciso I, do artigo 10 da Lei 4591/64, in verbis,
Art. 10. É defeso a qualquer condômino:
I – alterar a forma externa da fachada;
Em primeira análise, sob a luz do Código Civil e da Lei 4591/64,
pode-se dizer que o envidraçamento de sacadas em edifícios edilícios não
é permitido, isto porque, é inegável que a obra altera as
características marcantes e a unidade estética da fachada do edifício,
bem como trazer risco a edificação ou mesmo dissabores ao vizinho de
parede-meia e demais condôminos, trata-se, portanto, de uma obrigação
negativa do condômino, isto é, obrigação de não fazer.
No entanto, o mesmo artigo 10 da Lei 4591/64, que proíbe a alteração de
fachada, também a flexibiliza, especificamente em seu parágrafo § 2º,
in verbis:
§ 2º O proprietário ou titular de direito à aquisição de unidade poderá fazer obra que (VETADO) ou modifique sua fachada, se obtiver a aquiescência da unanimidade dos condôminos.
Além disso, ainda poder-se-á contrapor a proibição expressa no inciso I
do artigo 10 da Lei 4591/64, alegando-se que o envidraçamento da
sacada, desde que transparente, não afetaria propriamente a harmonia da
fachada, portanto, tal restrição não se aplicaria a estes casos.
Admitindo-se a tese, outros fatores haveriam de ser levados em
consideração, isto é, o risco à segurança e a possível dano a edificação
como um todo em razão da obra de envidraçamento, pois, há que se prever
que todos os condôminos a desejem, neste sentido, haveria a necessidade
da análise e perícia técnica do projeto de envidraçamento pretendido,
como também a análise e perícia técnica estrutural da edificação como um
todo, a fim de se obter o dimensionamento do peso do envidraçamento,
bem como dos objetos e coisas que poderiam lá ser dispostas, de modo a
ser afastado todo e qualquer risco a edificação e consequentemente dos
condôminos, empregados, como também a vizinhança do entorno.
Além disso, não havendo pretensão unânime para tal feito, em
observância ao direito de vizinhança, o condômino que pretendesse
envidraçar sua sacada haveria de informar seu vizinho de parede-meia, as
demais obras que pretende ou necessita realizar concomitantemente ao
pretendido envidraçamento da sua sacada, observando-se que
independentemente do envidraçamento ou não da sacada, é dever do
condômino o pedido de autorização ao seu vizinho para a construção de
armários e assemelhados que se utilize da parede-meia, conforme artigo
1.306; estando vedados, mesmo que autorizados, a construção de fornos,
churrasqueiras ou quaisquer aparelhos suscetíveis de produzir
interferências prejudiciais ao vizinho, conforme artigo 1.308 do Código
Civil. Neste sentido, haveria também de observar o regramento interno do
condomínio, isto é, a convenção condominial, bem como informar e
solicitar autorização ao grupo gestor do condomínio.
A não observância dos regramentos ora expostos dá ao vizinho de
parede-meia e demais condôminos prejudicados, incluindo-se os vizinhos
do entorno, isto é, os vizinhos extracondomínio, o direito de cessar as
interferências prejudiciais à segurança, conforme dispõe o artigo 1277
do Código Civil; bem como a obrigação daquele que os violou de demolir
as construções feitas, respondendo ainda pelas perdas e os danos
causados, artigo 1.312. Há sempre que se levar em consideração,
repetimos, que a realização de obras que acrescentem carga, ou alterem a
sua distribuição à estrutura da edificação, deve ser muito bem
avaliada, haja vista o risco do comprometimento das estruturas ou mesmo o
desabamento do edifício, não devem faltar exemplos de danos causados
pela inobservância do exposto.
Acresçam-se as regras da convenção condominial, as quais podem proibir
de forma expressa ou exigir quorum específico para a realização de
mudanças que importem, por exemplo, na alteração externa das fachadas,
seja ela qual for; mais ainda se tal mudança implicar em agravamento das
cotas condominiais.
Neste sentido, mesmo que a convenção condominial permita o
envidraçamento da fachada mediante a aprovação em assembléia, a sua
aprovação só será inquestionável se a mesma for dada por todos os
condôminos e de forma unânime, § 2º do art. 10 da Lei 4591/64,
incluindo-se aí – entendemos - mesmo aqueles que não estão em dia com
suas obrigações condominiais, sejam elas quais forem, haja vista o
caráter de alteração permanente da fachada que tal iniciativa tende a
produzir, aplicando-se tal entendimento mesmo que a convenção preveja,
por exemplo, quorum igual a 2/3, como é usualmente previsto nas
convenções condominiais para a tomada de decisões de grande relevância,
como é o caso.
Encerradas as considerações relativas à legislação a respeito do tema, passemos então a análise da jurisprudência.
2.2. O Envidraçamento das Sacadas e a Jurisprudência
A jurisprudência tem entendido ser possível o envidraçamento de
sacadas, desde que aprovada, como já mencionado, por unanimemente pelos
condôminos, vejamos então:
9092886-94.2002.8.26.0000 Apelação
Relator(a): Luiz Antonio de Godoy
Comarca: São Paulo
Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito Privado
Data do julgamento: 18/10/2011
Data de registro: 19/10/2011
Outros números: 2343024500
Ementa: OBRIGAÇÃO DE FAZER Condomínio Pretensão ao envidraçamento de sacada Hipótese em que seria alterada a forma externa da fachada do edifício Não aprovação da modificação pela unanimidade dos condôminos Sentença mantida Inteligência do art. 252, do RITJSP/2009 Recurso desprovido.
9204662-65.2003.8.26.0000 Apelação / Condomínio
Relator(a): Fábio Quadros
Comarca: São Paulo
Órgão julgador: 4ª Câmara de Direito Privado
Data do julgamento: 21/01/2010
Data de registro: 09/02/2010
Outros números: 0330130.4/0-00, 994.03.022030-1
Ementa: Demolitória. Alteração da fachada, por meio de envidraçamento da sacada. Preliminar afastada. Medida não autorizada pela Assembléia Gerai Alteração promovida por conta e risco da apelante. Decisão acertada. Recurso desprovido.
0118629-55.2008.8.26.0000 Agravo de Instrumento / Obrigação de Fazer / Não Fazer
Relator(a): Paulo Alcides
Comarca: São Paulo
Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito Privado A
Data do julgamento: 15/07/2008
Data de registro: 23/07/2008
Outros números: 5553134600, 994.08.118629-6
Ementa: OBRIGAÇÃO DE FAZER consistente em desfazimento de envidraçamento de sacada em unidade autônoma. Perícia técnica determinada pelo Juízo. Pretensão de obter o sobrestamento do feito e, conseqüentemente, a suspensão da prova técnica, até julgamento da ação de anulação de assembléia. Desnecessidade. Prejudicialidade não reconhecida. Realização da perícia recomendável para auxiliar na formação do convencimento do Juiz. Recurso desprovido
Do exposto, não há que se cogitar o envidraçamento de sacada sem o
consentimento de uma assembléia de condôminos, além disso, a aprovação
não unânime pode acarretar a obrigação do desfazimento da obra, pois,
não há como negar que houve alteração da fachada; além disso, viola o
disposto no §2º, do artigo 10 da Lei 4591/64.
Neste sentido, entende-se que o tipo de material utilizado, isto é,
vidros transparentes, como mencionado supra, não teria o condão de
amenizar as exigências convencionais e, sobretudo, as legais, isto é,
aprovação da totalidade dos condôminos, donde se entende,
independentemente destes estarem ou não em dia com suas obrigações
condominiais, pois, o estado de inadimplemento das obrigações
invariavelmente possui caráter transitório e o envidraçamento da sacada,
contrariamente, possui caráter de permanência, perenidade.
2.3. O Envidraçamento das Sacadas, as Despesas Derivadas e o Condomínio Edilício
Até este ponto, discutiu-se a possibilidade legal do envidraçamento da
sacada, possibilidade esta que segundo a legislação e jurisprudência,
pode ser entendida como possível. No entanto, na hipótese do
envidraçamento ser aprovado pela unanimidade dos condôminos, estariam
todos obrigados a contribuir para eventuais obras de reforço do solo,
pisos de concreto armado, vigas, colunas e demais obras que se fizerem
necessárias para tal intento? Entendemos que não, vejamos então.
O artigo 1340 é muito claro a respeito do agravamento das despesas
condominiais quando estas beneficiam apenas àqueles que dela se servem,
in verbis,
Art. 1.340. As despesas relativas a partes comuns de uso exclusivo de um condômino, ou de alguns deles, incumbem a quem delas se serve.
O envidraçamento de sacada é de caráter voluptuário, ou, se preferível,
destinado ao deleite daquele que a executa, não se configurando,
portanto, em despesas para conservação e manutenção do condomínio, logo
não obrigatória aos demais, não há como exigir que condôminos que não
queiram envidraçar suas sacadas arquem com as despesas, sejam elas quais
forem, para deleite de terceiro, a autorização neste caso não significa
anuência com as despesas que dela será originem, restringe-se a
permitir que a fachada do prédio seja alterada, à custa com perícias
técnicas, obras de reforços das estruturas, vigas, pisos, lajes, solo,
projetos arquitônicos e demais obras correlatas devem recair somente
sobre aqueles que dela se beneficiarão, no caso, recaírem sobre as cotas
condominiais dos que pretendam envidraçar sua sacada, pois desta
pretensão podem surgir tais gastos.
Conclusão
Do exposto, entendemos ser possível o envidraçamento de sacadas em
condomínios edilícios, desde que com vidros transparentes, sendo, no
entanto, imprescindível à aprovação da obra por todos os condôminos e de
forma unanime, incluindo-se aí também os inadimplentes com suas
obrigações e contribuições condominiais.
Sendo aprovado o envidraçamento, nos termos supraexpostos, deverá o
projeto ser objeto de análise e perícia técnica com o intuito de afastar
qualquer dano ou risco a segurança dos condôminos e do condomínio como
um todo, obtendo-se também a avaliação estrutural do edifício, dos pisos
e parapeitos das sacadas, bem como da carga máxima permitida, ou seja, o
peso máximo permitido para objetos e coisas que poderão ser acomodados
sobre o piso da sacada após o envidraçamento desta, haja vista o próprio
envidraçamento atribuir carga considerável sobre o piso e parapeito da
sacada que o acomoda.
Apesar da aprovação do envidraçamento de sacada estar condicionada,
segundo nosso entendimento, à totalidade dos condôminos nos termos
supracitados, as despesas, no entanto, haverão de ser suportadas somente
por àqueles que a pretendam; notadamente as despesas com contratação de
peritos, arquitetos e engenheiros, empreiteiros, bem como as acessórias
e derivadas para tal intento, conforme disposto no artigo 1340 do
Código Civil, in verbis:
Art. 1.340. As despesas relativas a partes comuns de uso exclusivo de um condômino, ou de alguns deles, incumbem a quem delas se serve.
Tendo em vista tal obra ser de caráter voluptuário, ou, se preferível,
destinado ao deleite daquele que a executa, não se configurando,
portanto, em despesas para conservação e manutenção do condomínio, logo
não obrigatória aos demais.
Por fim, admitida à possibilidade do envidraçamento das sacadas, além
da observância do exposto, entende-se necessário à submissão do projeto
de envidraçamento e respectivos laudos periciais e técnicos para
aprovação pela prefeitura local e demais órgão competentes.
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