5 de novembro de 2021, 6h35
Imagine-se empresário, à frente de grande grupo econômico,
que é subitamente acometido por doença incapacitante. Pela ordem legal, sua
esposa, que sempre se dedicou aos afazeres domésticos, do dia para a noite é
nomeada sua curadora e passa a comandar negócios com os quais nunca teve
familiaridade. Paralelamente, os filhos impugnam judicialmente a sua nomeação
e, em razão da cizânia familiar, é nomeado um terceiro, estranho à família, para
conduzir os negócios. Para piorar, no curso do processo de interdição medidas
inafastáveis precisam ser tomadas, como o aporte de significativos valores nas
sociedades, sob pena de prejuízo à atividade empresarial, mas, em face do
embate, o Poder Judiciário não autoriza a prática de atos societários.
Histórias como essa, em que alguém não pode praticar os atos
de sua vida civil, certamente não são raras. Nessas condições, a gestão
patrimonial deve ser confiada a quem for nomeado pelo Poder Judiciário. A
pessoa incapacitada sujeita-se, então, à curatela (interdição) e quem exerce a
administração do patrimônio é o curador.
A questão atinge contornos complexos se for considerado que
o artigo 1.775 do Código Civil prevê a ordem de quem está legitimado ao
exercício da curatela. Assim, o cônjuge ou companheiro, não separado de fato ou
de direito, é prioritariamente curador. Na sua falta, são chamados pai ou mãe
e, sucessivamente, os descendentes.
A ordem legal pode descortinar embates dentro dos núcleos
familiares, seja porque o cônjuge/companheiro não tem a confiança dos filhos da
pessoa enferma, seja porque quem é nomeado não tem familiaridade com a gestão
dos bens, expondo-os a riscos.
O legislador previu mecanismos que protejam o patrimônio da
pessoa incapaz — fiscalização da curatela pelo Ministério Público, dever de
periodicamente serem prestadas contas do exercício da curatela, necessidade de
autorização judicial para alienação de bens —, mas que, por outro lado,
travam-no. Ainda, esses instrumentos de proteção não tornam expert em assuntos
societários uma pessoa sem qualificação, assim como não garantem uma gestão que
vise ao melhor interesse de seu titular.
(...)
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