Em muitos casos, a demora ou omissão dos
legisladores obriga juízes a produzirem normas que preencham, ao menos
provisoriamente, as lacunas do ordenamento jurídico. Essa foi a
percepção adotada pela juíza Sirlei Martins da Costa, da 1ª Vara de
Família e Sucessões de Goiânia, quanto ao casamento homossexual. É que,
se em junho de 2012 ela decidiu que dois homossexuais não poderiam se
casar por falta de previsão legal, na terça-feira (28/5) ela mudou de
opinião e autorizou um casamento gay.
Na decisão do ano passado,
Sirlei da Costa afirmou que, apesar de não ver problemas no casamento
entre duas pessoas do mesmo sexo, somente lei aprovada pelo Congresso
Nacional poderia autorizá-lo. Para isso, escreveu, seria necessária
ampla discussão social sobre o tema. Já na sentença
da terça, ela segue em outra direção: "inegável que ao cumprir seu
dever precípuo de interpretar a norma, o julgador também produz norma".
Para
aprovar a união gay, ela recorre ao artigo 3º da Constituição Federal,
que define como um dos objetivos do país “promover o bem de todos, sem
preconceitos de origem, raça, sexo, cor idade e quaisquer outras formas
de discriminação”. Sirlei argumentou que a limitação da possibilidade de
exercer a intimidade sexual conforme o desejo atenta contra a dignidade
da pessoa. E a garantia apenas ao casamento heterossexual é uma
restrição de direito, apontou.
“Não encontro nenhum motivo para
dizer que o casamento entre pessoas do mesmo sexo pode trazer qualquer
prejuízo para a sociedade. A história mostra que o exercício da
intolerância é que gera catástrofes. Em corolário a isso, podemos
vislumbrar que o exercício e a prática da tolerância podem, quiçá, ser
positivos no sentido de promover o desenvolvimento da sociedade”, diz a
juíza, na decisão mais recente.
Em sua opinião, "não há como
negar que o julgamento do STF (ADI 4277/DF e ADPF 132/RJ), o julgamento
do STJ (RESP 1.183.378/RS) e até a Resolução 175 do CNJ sejam
influenciadores da formação de convicção do julgador no sentido
de permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo". Uma das provas
disso, segundo ela, é que após julgamento do STF, Corregedorias de
Justiça de dez estados regulamentaram a matéria: Santa Catarina, Rio de
Janeiro, Roraima, Paraná, Mato Grosso do Sul, Bahia, Sergipe, Piauí, São
Paulo e Rio de Janeiro.
Ressalvas
Apesar do poder transformador dessas interpretações, ela tem ressalvas quanto aos seus impactos no ordenamento jurídico. Ela pondera que o Código Civil "afirma categoricamente" que o casamento se dá entre homem e mulher e compete ao legislador analisar a questão. “Na verdade, a admissão do direito de casamento entre pessoas do mesmo sexo apenas impõe aos demais um dever: tolerar e respeitar as diferenças”, disse. A guinada de entendimento, de acordo com a juíza, se deve ao atraso dos legisladores em atender aos anseios da sociedade.
Apesar do poder transformador dessas interpretações, ela tem ressalvas quanto aos seus impactos no ordenamento jurídico. Ela pondera que o Código Civil "afirma categoricamente" que o casamento se dá entre homem e mulher e compete ao legislador analisar a questão. “Na verdade, a admissão do direito de casamento entre pessoas do mesmo sexo apenas impõe aos demais um dever: tolerar e respeitar as diferenças”, disse. A guinada de entendimento, de acordo com a juíza, se deve ao atraso dos legisladores em atender aos anseios da sociedade.
Para ela,
diferente de autorizar o casamento gay, a decisão do Supremo reconheceu a
entidade familiar criada na relação pública e duradoura entre pessoas
do mesmo sexo. O Supremo também garantiu, com aquele entendimento, que
casais gays devem ter os mesmos benefícios de uma união heterossexual,
conforme o artigo 226 da Constituição e o artigo 1.723 do Código Civil.
A
juíza ainda destacou na sentença que a Resolução 175/2013, do Conselho
Nacional de Justiça, vincula somente os cartórios a habilitarem o
casamento gay. A norma obriga os cartórios a converter a união estável
homossexual em casamento, se assim for o desejo do casal. Ao julgador,
de acordo com ela, cabem os princípios determinados pelo artigo 93 da
Constituição, que trata da prerrogativa de livre convencimento.
Posicionamento anterior
Ao recusar o pedido de união civil feito por dois homens, em junho de 2012, ela destacou que a legislação civil reconhece diversas formas de entidades familiares, sendo o casamento entre homem e mulher apenas uma delas. Mas o ordenamento jurídico não permite, justificou, a união entre duas pessoas do mesmo sexo no Brasil.
Ao recusar o pedido de união civil feito por dois homens, em junho de 2012, ela destacou que a legislação civil reconhece diversas formas de entidades familiares, sendo o casamento entre homem e mulher apenas uma delas. Mas o ordenamento jurídico não permite, justificou, a união entre duas pessoas do mesmo sexo no Brasil.
Naquela época, a aprovação de
regras sobre o tema já havia acontecido em alguns países da Europa,
estados norte-americanos e na Argentina. Mas Sirlei da Costa ressaltou
que, nesses casos, foram necessários amplos debates no Legislativo e na
sociedade para garantir a norma.
"Em nenhum desses países, o
casamento entre pessoas do mesmo sexo passou a ser possível por decisão
judicial. Caso contrário, estar-se-ia permitindo decisões manipulativas
aditivas de garantia em controle concreto de constitucionalidade, o que
não é possível, conforme posicionamento atual do Supremo Tribunal
Federal que, inclusive, nega possibilidade jurídica às sentenças
manipulativas a pretexto de evitar uma atividade de 'legislação
positiva' ao Judiciário.", ponderou.
Em fevereiro de 2007 a mesma juíza,
à época na 3ª Vara de Família, Sucessões e Cível de Goiânia, já havia
reconhecido um relacionamento homoafetivo estável como entidade
familiar, com “todas as conseqüências legais advindas de uma união”.
Segundo Sirlei Martins Costa, embora náo houvesse legislação específica
para o tema, a jurisprudência era pacífica sobre a possibilidade
jurídica da união de duas pessoas do mesmo sexo. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-GO.
Victor Vieira é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 1º de junho de 2013
http://www.conjur.com.br/2013-jun-01/omissao-congresso-juiza-muda-opiniao-autoriza-casamento-gays
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