Duas decisões recentes da 1ª Turma do Supremo
Tribunal Federal confirmaram o novo entendimento da corte que agora é
favorável à possibilidade de se responsabilizar pessoas jurídicas por
crime ambiental ainda que ocorra a absolvição dos ocupantes de postos de
direção da empresa. Até então, toda a jurisprudência indicava o sentido
contrário, condicionando a legitimidade de um processo por crime
ambiental contra pessoas jurídicas à discriminação da conduta de pessoas
físicas a ela ligada.
Os dois Recursos Extraordinários que
tratavam da matéria — decididos no mesmo sentido — eram de relatoria da
ministra Rosa Weber e foram julgados em sessão ocorrida no começo de
agosto. Ambos os processos apenas cuidavam de questões preliminares
referentes a ações penais que correm em instâncias inferiores.
O
primeiro recurso teve como ré a Petrobras. Por maioria, os ministros
conheceram parcialmente o Recurso Extraordinário de autoria do
Ministério Público Federal, cassando assim o acórdão que trancava a ação
penal referente à pessoa jurídica sob o argumento da ausência de
imputação, no processo, contra os dirigentes responsabilizados pela
conduta criminosa. Dessa forma, a turma afastou a prescrição da ação
penal em caráter preliminar, não reconhecendo a presença de elementos
que a justificassem.
Para os ministros, a prescrição nunca fora o
objeto de debate do mandado de segurança que deu origem ao recurso no
Supremo. O mandado de segurança, observaram os ministros da 1ª Turma,
fora impetrado apenas para trancar a ação penal sob a justificativa da
ausência de responsabilização de pessoa física ligada à estatal. A
prescrição só foi mencionada por conta da demora em julgá-la, de forma
que cabe ao magistrado da instância em que corre o processo, de acordo
com a decisão do STF, avaliar este ponto nos autos da ação penal.
Restaram
vencidos os ministros Luiz Fux e Marco Aurélio, que entenderam que a
data de recebimento de denúncia poderia justificar a prescrição. O
ministro Marco Aurélio avaliou ainda, durante o julgamento, que não cabe
a interpretações de uma norma no sentido de desfavorecer aquele quem a
regra visa beneficiar, neste caso a ré, que havia se beneficiado do
trancamento do acórdão.
No segundo RE, a 1ª Turma rejeitou o
entendimento do Superior Tribunal de Justiça ao reconhecer que para se
imputar os agentes individualmente no contexto do delito ambiental
causado por uma empresa é necessária a devida responsabilização
jurídico-criminal através da individualização de cada ato atribuído à
pessoa específica. A maioria dos ministros votou no sentido de entender
que não se pode, portanto, condicionar a imputabilidade da pessoa
jurídica a seus agentes responsáveis sem a devida descrição da conduta,
pois isso afrontaria diretamente o artigo 225, inciso 3º, da
Constituição Federal.
Novamente restaram vencidos os ministros
Marco Aurélio e Luiz Fux, que entenderam que o referido artigo da
Constituição não criou a figura da responsabilidade penal da pessoa
jurídica. Para os ministros, ao estabelecer que os crimes ambientais
sujeitariam “os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções
penais e administrativas”, a norma impôs apenas sanções administrativas
às pessoas jurídicas. Fux observou que o artigo 5º ao tratar da
“pessoalidade da pena” restringe interpretações no sentido de reconhecer
a responsabilidade penal da pessoa jurídica isoladamente.
Ambas
as decisões abriram um importante precedente em relação a se imputar a
pessoas jurídicas a prática de crime ambiental. Até então, a
possibilidade de instauração de ação penal contra pessoa jurídica estava
sujeita aos casos em que ficasse provada a participação de agentes da
empresa na prática do crime ambiental. Do contrário, a pessoa jurídica
sequer poderia ser processada. Conforme observaram os advogados Eduardo da Silva e Victor Penitente Trevizan em artigo publicado na revista Consultor Jurídico, neste
domingo (1º/9), as decisões sinalizaram uma significativa mudança de
jurisprudência, revendo assim um "maciço posicionamento" inclusive do
Superior Tribunal de Justiça em sentido contrário.
Rafael Baliardo é repórter da revista Consultor Jurídico em Brasília.
Revista Consultor Jurídico, 3 de setembro de 2013
http://www.conjur.com.br/2013-set-03/stf-muda-entendimento-responsabilizar-empresas-crimes-ambientais
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