terça-feira, 8 de outubro de 2013

Transformações do contrato (Paulo Lôbo)



O que mudou, relativamente aos princípios fundamentais do contrato, com o advento do Código Civil de 2002?
É quase um lugar comum a afirmação de que o contrato ou o direito contratual é a parte do direito menos afetada pela mudança social ou legal. Atribui-se ao direito das obrigações (especia­l­mente o contratual) uma certa estabilidade milenar, porque, mais que os outros ramos jus­civilísticos, perpetuaria os princípios que nos legaram os romanos, assegurando a raiz comum do grande sistema jurídico romano-germânico.
Com efeito, o contrato jurisdiciza o fenômeno mais freqüente do cotidiano das pessoas, em todas as épocas. Na sociedade atual, a cada passo, o cidadão ingressa em relações negociais, consciente ou inconscientemente, para satisfação de suas necessidades e desejos e para adquirir e utilizar os bens da vida e os serviços. Até mesmo quando dormimos poderemos estar assumindo obrigações contratuais, como se dá com os fornecimentos de luz ou de água.
A sociedade de massas, neste final de século XX, multiplicou a imputação de efeitos negociais a um sem número de condutas, independentemente da manifestação de vontade dos obrigados. A globalização econômica  utiliza o contrato como instrumento de  exercício de dominação dos mercados e de desafio aos direitos nacionais, especialmente mediante condições gerais predispostas, que apenas são vertidas (quando o são) aos idiomas locais. A Administração pública tem abdicado dos clássicos instrumentos de soberania e imperium para desenvolver políticas públicas contratualizadas, como os contratos de gestão, em fenômeno que foi tido como “a fuga para o direito privado”[1]. A relação contratual de consumo, na dimensão que transcende os interesses dos figurantes e alcança a cidadania, está provocando uma das mais profundas transformações do direito, principalmente a partir da última década do século XX, no estalão da interdisciplinaridade. 
O contrato é, pois, fenômeno cada vez mais onipresente na vida de cada um. No entanto, não é e nem pode ser categoria abstrata e universalizante, de características inal­teradas em face das vicissitudes históricas. Em verdade, seus significado e conteúdo conceptual modificaram-se profundamente, sempre acompanhando as mudanças de valores da humanidade.
Os princípios contratuais refletem essas vicissitudes históricas e evolutivas.

LÔBO, Paulo. Princípios contratuais. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3750, 7 out. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25359>. Acesso em: 8 out. 2013.

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