terça-feira, 8 de outubro de 2013

Princípios individuais dos contratos (Paulo Lôbo)



O direito contratual que se toma como paradigma, tanto para a formação como para a prática dos operadores do direito, é o que se desenhou durante a hegemonia do Estado liberal, corporificando nas codificações a concepção iluminista da autonomia da vontade.
De  modo geral podem ser assim agrupados os princípios que determinam a função individual do contrato:
I – Princípio da autonomia privada (ou da autonomia da vontade, ou da liberdade contratual);
II – Princípio da obrigatoriedade (pacta sunt servanda ou da intangibilidade);
III – Princípio da relatividade subjetiva (ou da eficácia relativa às partes contratantes).
No Estado liberal, o contrato converteu-se em instrumento por excelência da autonomia da vontade, confundida com a própria liberdade, ambas impensáveis sem o direito de proprie­dade privada. Liberdade de contratar e liberdade de propriedade seriam interdependentes, como irmãs siamesas.
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, da Revolução Francesa, em 1789, proclamou a sacralidade da propriedade privada (“Art. 17. Sendo a propriedade um direito sagrado e inviolável...”), tida como exteriorização da pessoa humana ou da cidadania. Emancipada da rigidez estamental da Idade Média, a propriedade privada dos bens econômicos ingressou em circulação contínua, mediante a instrumentalização do contrato.
Autonomia da vontade, liberdade individual e propriedade privada, transmigraram dos fundamentos teóricos e ideológicos do Estado liberal para os princípios de direito, com  pretensão de universalidade e intemporalidade.
Considere-se o mais brilhante dos pensadores da época, Kant, especialmente na Fundamentação da Metafísica dos Costumes[2]  onde distingue o que entende por autonomia de heterono­mia. A autonomia é o campo da liberdade, porque os seres humanos podem exercer suas escolhas e estabelecerem regras para si mesmos, coletivamente ou interindividualmente. A heteronomia, por seu turno, é o campo da natureza cujas regras o homem não pode modificar e está sujeito a elas[3].
Assim, o mundo ético, em que se encartaria o direito, seria o reino da liberdade dos indivíduos, enquanto tais, porque a eles se dirige o princípio estruturante do imperativo categórico kantiano. Na fundamentação filosófica kantiana, a autonomia envolve a criação e aplicação de todo o direito. Posteriormente, os juristas deram feição dogmática estrita ao princípio da autonomia, significando o espaço de auto-regulação dos interesses privados, de onde emerge o contrato.

LÔBO, Paulo. Princípios contratuais. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3750, 7 out. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25359>. Acesso em: 8 out. 2013.

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