terça-feira, 8 de outubro de 2013

Princípios sociais dos contratos (Paulo Lôbo)



O firme propósito de trazer o novo Código Civil ao contexto e à ideologia da terceira fase histórica do Estado Moderno (as três fases corresponderiam às do Estado absolutista, do Estado liberal e do Estado social) foi sempre destacado pelos autores do projeto, nomeadamente por Miguel Reale, quando se refere à diretriz de “socialidade”[5], que o teria informado.
Esse breve pano de fundo contribui para esclarecer a força crescente dos princípios contratuais típicos do Estado social, os quais, de um modo ou de outro, comparecem nos códigos brasileiros referidos. São eles:
a) princípio da função social do contrato;
b) princípio da boa-fé objetiva;
c) princípio da equivalência material do contrato.
Os princípios sociais do contrato não eliminam os princípios individuais do contrato, a saber, o princípio da autonomia privada (ou da liberdade contratual em seu tríplice aspecto, como liberdades de escolher o tipo contratual, de escolher o outro contratante e de escolher o conteúdo do contrato), o princípio de pacta sunt servanda (ou da obrigatoriedade gerada por manifestações de vontades livres, reconhecida e atribuída pelo direito) e o princípio da eficácia relativa apenas às partes do contrato (ou da relatividade subjetiva);  mas limitaram, profundamente, seu alcance e seu conteúdo.

A matéria como está prevista no novo Código Civil 

O novo Código Civil traz menção expressa à “função social do contrato” (art. 421) e, nesse ponto, foi mais incisivo que o Código de Defesa do Consumidor. Também fica consagrado, definitivamente e pela primeira vez na legislação civil brasileira, a boa-fé objetiva, exigível tanto na conclusão quanto na execução do contrato (art. 422). A referência feita ao princípio da probidade é abundante uma vez que inclui-se no princípio da boa-fé, como abaixo se demonstrará. No que toca ao princípio da equivalência material o Código o incluiu, de modo indireto, nos dois importantes artigos que disciplinam o contrato de adesão (arts. 423 e 424), ao estabelecer a interpretação mais favorável ao aderente (interpretatio contra stipulatorem) e ao declarar nula a cláusula que implique renúncia antecipada do contratante aderente a direito resultante da natureza do negócio (cláusula geral aberta, a ser preenchida pela mediação concretizadora do aplicador ou intérprete, caso a caso).
Os princípios sociais adotados aproximam, muito mais do que se imaginava, o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor. A tendência, portanto, é o desaparecimento progressivo da distinção dos regimes jurídicos dos contratos comuns e dos contratos de consumo, ao menos no que concerne a seus princípios e fundamentos básicos.
A utilização de princípios e cláusulas gerais sempre foi vista com muita reserva pelos juristas, ante sua inevitável indeterminação de conteúdo e, no que concerne ao hegemônico individualismo jurídico do Estado liberal, o receio da intervenção do Estado nas relações privadas, por meio do juiz. Todavia, para a sociedade em mudanças, para a realização das finalidades da justiça social e para o trato adequado do fenômeno avassalador da massificação contratual e da parte contratante vulnerável, constituem eles ferramentas hermenêuticas indispensáveis e imprescindíveis.

LÔBO, Paulo. Princípios contratuais. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3750, 7 out. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25359>. Acesso em: 8 out. 2013.

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