O firme
propósito de trazer o novo Código Civil ao contexto e à ideologia da terceira
fase histórica do Estado Moderno (as três fases corresponderiam às do Estado
absolutista, do Estado liberal e do Estado social) foi sempre destacado pelos
autores do projeto, nomeadamente por Miguel Reale, quando se refere à diretriz
de “socialidade”[5], que o teria informado.
Esse
breve pano de fundo contribui para esclarecer a força crescente dos princípios
contratuais típicos do Estado social, os quais, de um modo ou de outro,
comparecem nos códigos brasileiros referidos. São eles:
a) princípio da função social do contrato;
b) princípio da boa-fé objetiva;
c) princípio da equivalência material do contrato.
Os
princípios sociais do contrato não eliminam os princípios individuais do
contrato, a saber, o princípio da autonomia privada (ou da liberdade contratual
em seu tríplice aspecto, como liberdades de escolher o tipo contratual, de
escolher o outro contratante e de escolher o conteúdo do contrato), o princípio
de pacta sunt servanda (ou da obrigatoriedade gerada por manifestações
de vontades livres, reconhecida e atribuída pelo direito) e o princípio da
eficácia relativa apenas às partes do contrato (ou da relatividade
subjetiva); mas limitaram, profundamente, seu alcance e seu conteúdo.
A matéria como está prevista no novo Código Civil
O novo
Código Civil traz menção expressa à “função social do contrato” (art. 421) e,
nesse ponto, foi mais incisivo que o Código de Defesa do Consumidor. Também
fica consagrado, definitivamente e pela primeira vez na legislação civil
brasileira, a boa-fé objetiva, exigível tanto na conclusão quanto na execução
do contrato (art. 422). A referência feita ao princípio da probidade é
abundante uma vez que inclui-se no princípio da boa-fé, como abaixo se
demonstrará. No que toca ao princípio da equivalência material o Código o
incluiu, de modo indireto, nos dois importantes artigos que disciplinam o
contrato de adesão (arts. 423 e 424), ao estabelecer a interpretação mais
favorável ao aderente (interpretatio contra stipulatorem) e ao declarar
nula a cláusula que implique renúncia antecipada do contratante aderente a
direito resultante da natureza do negócio (cláusula geral aberta, a ser
preenchida pela mediação concretizadora do aplicador ou intérprete, caso a
caso).
Os
princípios sociais adotados aproximam, muito mais do que se imaginava, o Código
Civil e o Código de Defesa do Consumidor. A tendência, portanto, é o
desaparecimento progressivo da distinção dos regimes jurídicos dos contratos
comuns e dos contratos de consumo, ao menos no que concerne a seus princípios e
fundamentos básicos.
A
utilização de princípios e cláusulas gerais sempre foi vista com muita reserva
pelos juristas, ante sua inevitável indeterminação de conteúdo e, no que
concerne ao hegemônico individualismo jurídico do Estado liberal, o receio da
intervenção do Estado nas relações privadas, por meio do juiz. Todavia, para a
sociedade em mudanças, para a realização das finalidades da justiça social e
para o trato adequado do fenômeno avassalador da massificação contratual e da
parte contratante vulnerável, constituem eles ferramentas hermenêuticas
indispensáveis e imprescindíveis.
Nenhum comentário:
Postar um comentário