É o tipo de exercício da guarda que possui raízes profundas em nosso
ordenamento jurídico, posto que, durante décadas chegou a ser o único
admitido pelo direito (PERES, 2002). Segundo dados do IBGE, a guarda
unilateral ainda é predominante, correspondendo ao tipo de guarda
escolhido em 87,6% dos divórcios e separações judiciais que tramitavam
no Judiciário em 2009 conforme a última pesquisa do órgão (JORDÃO;
RUBIN, 2011).
Um dos genitores estará incumbido de ser o “guardião”, exercendo tanto a
guarda jurídica como a física, pois permanecerá no mesmo residindo com a
prole. O outro genitor é denominado pela doutrina como “visitante” ou
“não guardião” justamente por gozar de forma menos frequente do contato
com os filhos, deixando de ter efetivamente a guarda física. Assim
define o Código Civil em seu artigo 1.583, § 1º: “Compreende-se por
guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o
substitua (art. 1.584, § 5º) [...]”.
A escolha referente a tal espécie de guarda cabe, primordialmente, ao
ex-casal, por força do artigo 1.584, inciso I do CC/02, ou, não havendo
consenso, será determinado pelo juiz (inciso II do mencionado
dispositivo). Os critérios para a escolha do genitor guardião, à época
do Código Civil de 1916 diziam respeito à “inocência” do cônjuge que não
deu causa à separação. Somente a este caberia deter a guarda material
dos filhos, o que foi, ao longo das décadas, abrandado até chegar à
atual disposição do § 2º do artigo 1.584 do CC/02:
“§ 2º A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele
melhores condições para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para
propiciar aos filhos os seguintes fatores:
I – afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar;
II – saúde e segurança;
III – educação.”
O atual Código, ao contrário do anterior, consagra a relevância do
interesse do menor na determinação de qual genitor deterá a sua guarda,
pois os incisos referem-se a necessidades infanto-juvenis que devem ser
supridas. Para Silvio Neves Baptista o guardião será aquele “[...] em
cuja companhia o menor se sinta mais feliz e seguro [...]” (2000, p.
43), sendo recomendável, pois, que a guarda seja do genitor que dispuser
de maior tempo para estar em companhia do filho. O autor acrescenta
outros requisitos: o menor deve ficar com o genitor que continuar
residindo no antigo lar do casal, para que não haja perda de
relacionamentos com vizinhos, parentes e amigos de escola, e além disso,
esteja desprovido do intuito de obstaculizar o convívio dos filhos com o
genitor visitante (2000).
O guardião ainda deve ser aquele capaz de dar
“[...] à criança o cuidado no dia-a-dia, tais como higiene, preparação
e planejamento das refeições, cuidados médicos, incluindo enfermagem e
transporte para o médico, planos para interação social com amigos depois
da escola, deitar a criança na cama, disciplina e educação (religiosa,
moral, social e cultural), etc (SILVA, D. M. P. da, 2009, p.104).”
Resta notória a concentração de encargos na pessoa do genitor guardião,
situação que, à época do casamento, não seria permitida, pois a
legislação preceitua que os cônjuges exercerão deveres e direitos de
forma igualitária. Para Denise Comel “É possível concluir que, o que se
se atribui é o exercício deste poder, ainda que de forma não exclusiva,
mas com relativa autonomia e independência diante do outro pai (2003, p.
249).
Ainda no tocante à escolha do genitor que exercerá de fato a guarda
prevalece o entendimento de que a mãe é a melhor capacitada para tal
responsabilidade. Em que pese a isonomia constitucional, está arraigada
na cultura brasileira o pensamento de que à mulher é dada naturalmente a
habilidade para cuidar, o que, por sua vez, é fruto da histórica
divisão tradicional de papéis dentro da família (PERES, 2000).
O papel destinado ao genitor visitante é resumido no § 3º do artigo
1.583 do CC/02: “A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a
detenha a supervisionar os interesses dos filhos.” Enquanto um dos
genitores efetivamente cria, educa e cuida da prole, ao outro resta o
dever de fiscalizar em que sentido é dirigida esta criação, e caso
discorde da maneira como age o guardião, deve socorrer-se do Poder
Judiciário. Na prática o não guardião também fica obrigado a prestar
alimentos aos filhos que com ele não residem (DIAS, 2000).
A convivência entre o genitor visitante e seus filhos é mantida através
do sistema de visitas, consistindo este em prévia estipulação (pelo
próprio ex-casal ou pelo juiz) de quantos e quais dias na semana, no mês
e no ano, inclusive dentro de quais horários se darão encontros de
crianças e adolescentes com os não guardiões.
A doutrina, ao longo de muitos anos, tem utilizado as expressões
“direito de guarda” e “direito de visitas” como se fossem duas
prerrogativas contrapostas: a primeira pertencente ao guardião e a
segunda ao visitante. Alguns autores, analisando modificações
legislativas em torno do direito de família, apresentam posicionamento
diferenciado.
“A nosso ver esta é uma visão equivocada do fenômeno, pois enquanto a
guarda é um poder-dever do pai, cujo beneficiário da norma é o filho, a
visita é um direito de personalidade do filho de ser visitado não só
pelos pais, como por qualquer pessoa que lhe tenha afeto (BAPTISTA,
2000, p. 44).”
Atualmente mesmo os juristas que ainda utilizam a expressão “direito de
visitas” como sendo prerrogativa dos genitores reconhecem que o
objetivo maior do seu exercício é a concretização do direito
infanto-juvenil à convivência familiar:
“O novo paradigma legal, privilegiando o interesse dos filhos, hierarquizado superlativamente na ordem constitucional como prioridade absoluta,
deverá nortear todas as questões de direito de família envolvendo os
filhos, inclusive quanto ao direito de visitas (COSTA, 2001, p. 85,
grifo do autor).”
Desta forma, atualmente pode-se falar em “direito à visitação” do filho
menor tendo em vista e efetivação do direito fundamental à convivência
familiar. Como antes explicado, esta convivência não se restringe ao
círculo formado pelos genitores e pelo filho, e por isso o parágrafo
único do artigo 1.589 permite que a visitação também seja estabelecida
entre netos e avós, observados, em qualquer caso, o interesse
infanto-juvenil.
CLARINDO, Aniêgela Sampaio.
Guarda unilateral e síndrome da alienação parental. Jus Navigandi, Teresina,
ano 18,
n. 3583,
23 abr. 2013
.
Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/24254>. Acesso em: 24 abr. 2013.
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